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O uso repetitivo de palavras como cautela na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) apresentada, nesta terça-feira (7), reforçou, na visão do mercado, o momento de incerteza e a convicção de que não será um dado ou um evento específico que irá alterar o voo da autoridade monetária — o que ficou claro quando o colegiado destacou que deve manter a velocidade de ajustes adotada até aqui nas próximas duas reuniões.
“Antes de cortes de mais 100 bps [1 ponto percentual], é difícil encontrar justificativas para baixar o ritmo de ajustes. O BC tem gordura para queimar, somando a questão da inflação com o nível atual de juros”, defende Mario Schalch, gestor de multimercado da Neo Investimentos, em entrevista ao InfoMoney logo após a divulgação da ata.
Para o gestor, mais dois cortes levariam a Selic para o patamar de 11,25% até janeiro do ano que vem, o que seria uma taxa alta e “perfeitamente cabível” na comparação com os juros americanos, que hoje estão na faixa de 5,25% e 5,50% ao ano.
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Na avaliação de Schalch, ainda é cedo para dizer qual postura o BC deverá adotar nas reuniões a partir de março, já que há “muita coisa para acontecer e dado a ser divulgado”. Mas, diz, é difícil imaginar que a taxa básica de juros termine o ano que vem em 9%, levando em conta que o mercado estima que os juros americanos estejam entre 4,70% e 4,80% em 2024.
“As taxas de juros nos EUA são referência para o mundo. Isso cria uma competição de recursos e eleva a barra para as taxas ao redor do mundo. Se chegar nesse patamar nos Estados Unidos, é difícil a Selic bater 9%”, ressalta Schalch.
Caso isso aconteça, o executivo avalia que poderia ocorrer um grande deslocamento de recursos para os Estados Unidos. “É nesse ponto que o Copom coloca cautela e limite para o que pode acontecer aqui no Brasil.”
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Embora o mercado tenha animado com a divulgação de dados mais fracos da economia americana na semana passada, com destaque para os números do mercado de trabalho e indicadores industriais, o gestor alerta que não vê uma “mudança estrutural” na visão sobre os Estados Unidos.
“Dada a magnitude da alta de juros que tivemos nos Estados Unidos, o otimismo está dentro do que eu considero ruído”, destaca. O gestor lembra que, antes da decisão do Federal Reserve (Fed, banco central americano) na última quarta-feira (1), o mercado precificava uma chance de 29% de ter mais uma alta de juros nos Estados Unidos na reunião deste mês.
Agora, a probabilidade de uma elevação nos juros na reunião de dezembro está abaixo de 10%, segundo dados do CME Group. “O mercado já tinha como cenário-base a não elevação dos juros. Agora, ficou um cenário mais provável”, avalia.
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Mas, para Schalch, é preciso que as métricas de remuneração nos Estados Unidos caiam mais e que o mercado de trabalho mostre mais sinais de aperto para que o Fed tenha certeza de que não será necessário elevar mais os juros.
Para o gestor, o rendimento médio dos títulos americanos nos últimos 12 meses, por exemplo, teria que cair de atuais 4% a 5% para em torno de 3%.
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“Quanto mais tempo [o Fed] tiver para testar o que fez, mais vai conseguir ter convicção de que não precisa subir os juros”, pondera o gestor.
Considerando que o otimismo visto nos últimos dias nas Bolsas americanas e no recuo dos rendimentos dos Treasuries possa ser um ruído, o executivo conta que não fez nenhuma alteração recente na carteira e que está com posições que se beneficiam da estimativa de juros americanos abaixo do que o mercado precifica em 2025, diante dos efeitos defasados e do forte aperto das condições financeiras registrado desde o início do ciclo de alta do Fed.
Já no cenário local, a casa trabalha com posições que se beneficiam da projeção de Selic próxima de 10% ao fim de 2024, sem detalhar os tipos de alocação.
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Fiscal
Para além do cenário internacional, outro tema que mereceu destaque na ata envolve a questão fiscal. Embora o trecho tenha chamado atenção do mercado e a preocupação tenha sido reforçada durante evento por Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, Schalch defende que a questão fiscal deve ser vista como terceira variável para o Copom neste momento — atrás dos juros nos Estados Unidos e do cenário de inflação de curto prazo.
“Não é irrelevante, mas as outras são mais relevantes para o contexto atual. Quanto menos o Copom se intrometer nessa discussão sobre a meta, melhor. Ele tem tratado as consequências, o que é correto”, analisa.