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SÃO PAULO – Em meio às medidas de isolamento social adotadas para conter o avanço do coronavírus, o mundo enfrentou uma rápida transformação de hábitos antes tidos como naturais. O trabalho saiu do escritório e foi para casa, as compras migraram do shopping para a internet e as viagens tiveram que ser canceladas. Diante disso, um cenário que prometia grandes ganhos para indústria de fundos imobiliários ficou sob pressão.
Após valorização de 36% em 2019, o Ifix, índice que mede o desempenho dos FIIs negociados em Bolsa, caminha para encerrar 2020 no vermelho, com perdas acumuladas da ordem de 12,6% no ano até segunda-feira (21). Desde o piso do ano, em 18 de março, contudo, o índice já acumula alta de 106,4%.
Levantamento feito pela Economatica a pedido do InfoMoney mostra que os fundos com melhor desempenho em 2020 foram os de recebíveis imobiliários, tidos como mais defensíveis na crise, por possuírem papéis de renda fixa na carteira.
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No topo da lista está o Hectare Crédito Estruturado (HCTR11), com ganhos de 40%. Na sequência aparecem Iridium Recebíveis Imobiliários (IRDM11), com alta de 26,2%, e o FII de incorporação residencial Mérito I (MFII11), com retorno de 16,6%.
Na ponta oposta, das maiores perdas, ficaram fundos de escritórios, um fundo de fundos imobiliários e um FII de hotéis. É o caso do Pátria Edifícios Corporativos (PATC11), com perda de 39,5%, do Continental Square Faria Lima (FLMA11), com queda de 37%, e do FOF Bradesco Carteira Imobiliária Ativa (BCIA11), com desempenho negativo de 36,1%.
Foram considerados na amostra apenas os fundos que compõem o Ifix. Confira o desempenho dos melhores e piores a seguir:
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Quando analisado o desempenho em dezembro, os maiores ganhos partiam do fundo Quasar Agro (QAGR11), com valorização de 7,9% no mês, enquanto as maiores perdas, de 16,3%, eram do FII de agências bancárias BB Progressivo (BBFI11B).
“A carteira de recebíveis é de dívidas e, por isso, é tida como prioridade no pagamento das empresas e das pessoas físicas”, assinala Marcos Baroni, especialista em fundos imobiliários da Suno Research, destacando os menores níveis de inadimplência na classe.
Ele afirma que muitos recebíveis têm lastro residencial e, mesmo na crise, a dívida é a primeira conta a ser paga, ainda que tenha que ser renegociada, de forma a manter o imóvel.
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O professor da Suno lembra ainda da alta dos preços, que contribuiu para a valorização dos ativos, dado que são papéis com contratos indexados à inflação, seja ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ou ao Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M).
No ano, o IPCA acumula alta de 3,13% e, em 12 meses, de 4,31%, acima do centro da meta, de 4%. Já o IGP-M tem alta de 22%, no ano, e de 24,5%, em 12 meses até novembro.
Com relação aos FIIs de lajes corporativas, mais impactados pelo avanço do trabalho remoto e da crise econômica, Baroni afirma que a maior preocupação recai sobre o enfraquecimento da atividade.
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“Se a economia é fraca, as empresas não se expandem e projetos de contratação de time podem ter que aguardar. Acredito que o mercado de escritórios ainda vai ser testado em 2021 sobre esse aspecto”, afirma.
Ainda assim, as perspectivas para o mercado de fundos imobiliários como um todo no próximo ano são positivas, diz, considerando o cenário de vacinação no primeiro semestre, um esperado avanço das reformas e uma redução da pressão fiscal.
“Como a questão fiscal vai ser tratada precifica os juros futuros e impacta a precificação de FIIs no curto prazo. Com reformas, os juros futuros caem e os FIIs disparam. Mas se começar o ano com problema fiscal, o juro futuro tende a subir e as cotas dos FIIs, a caírem”, diz.
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Para Raul Grego, analista de fundos imobiliários da Eleven Financial Research, o segmento de escritórios oferece oportunidades e uma boa relação entre risco e retorno.
A avaliação é de que lajes bem localizadas devem continuar a apresentar demanda e são bons ativos para se estar posicionado visando o longo prazo, de três a quatro anos. O setor, junto ao de shopping centers, faz parte da carteira recomendada da Eleven visando ganho de capital.
Com relação aos fundos de papel, os produtos devem continuar a se destacar no próximo ano, segundo Grego, em meio à alta da inflação. Novas emissões também devem contribuir para o crescimento do segmento.
Levantamento feito pela Eleven Research com base em dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) mostra que, das ofertas para listagem ou aumento de capital em Bolsa protocoladas até 18 de dezembro, a maior parte (34%) de fundos de papel.
Os dados mostram um apetite dos investidores por produtos alternativos e o movimento deve continuar neste ritmo no próximo ano, assinala Grego, com uma oferta possivelmente mais espalhada entre os diferentes segmentos, dado que, em 2020, não houve emissão no setor de shoppings na Bolsa.
Entre os FIIs vistos com cautela por Grego estão os de hospitais – que costumam ser monolocatários, isto é, com um único inquilino e, consequentemente, mais risco –, bem como os de agências bancárias.
A justificativa é de que o segmento de agências está passando por uma transformação em meio à digitalização e que os contratos atípicos desses fundos têm prazo de vencimento nos próximos anos, em 2022 e 2023, com risco de não serem renovados.
“O mercado de FIIs deve ser olhado com foco no longo prazo e não no horizonte mais próximo, desprezando outras variáveis que podem impactar o yield e até o retorno total. Por mais que se tenha a facilidade de vender em D+2, o pensamento precisa ser de longo prazo”, afirma.
CRIs pulverizados
Com forte desempenho no ano, o FII Hectare Crédito Estruturado possui uma carteira composta por Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) de lastro pulverizado, isto é, em vez de um contrato para uma única empresa, são centenas de contratos de compra e venda.
“Geralmente a operação é vista como de maior risco, dado que, em vez de se estar exposto a uma Ambev, por exemplo, está exposto a diversas famílias que compraram imóveis e com uma capacidade financeira menor que a de grandes empresas”, diz Eduardo Malheiros, sócio diretor da Hectare Capital.
Nos meses de abril a maio, Malheiros conta que o fundo chegou a aumentar a alocação em cotas sênior de CRIs, de forma a aumentar o caráter mais defensivo do portfólio. No caso de um evento de crédito, os detentores dessas cotas têm sua rentabilidade assegurada, enquanto os cotistas subordinados funcionam como um “escudo”, recebendo um pagamento menor, diz.
Atualmente, o fundo HCTR11 possui 35 papéis no portfólio que financiam cerca de cem projetos de incorporação espalhados pelo Brasil. Todos os papéis são indexados à inflação, com cerca de 60% do total atrelado ao IGP-M.
Ganhos com inflação
No Iridium Recebíveis Imobiliários, a alta de preços e a maior procura por papéis indexados levaram o fundo a embolsar ganhos na crise.
Rafael Selegatto, gestor da Iridium, cita como exemplo o “CRI BB Mafre”, comprado antes da pandemia com taxa de IGP-M mais 8,2% e vendido há cerca de dois meses a IGP-M mais 4%. “Aproveitamos a maior demanda por conta da valorização do IGP-M, algo pontual, para vender papéis por uma taxa extremamente alta”, diz.
Selegatto afirma que a carteira do fundo praticamente não teve inadimplência na crise e que, embora uma ou outra empresa tenha pedido mais fôlego, para alongar parcelas, não houve nenhuma execução de garantias.
Com a queda das cotas no mercado secundário no auge da crise, nos meses de março e abril, o fundo aproveitou para comprar ativos que estavam com preços depreciados, conta. Como o fundo estava bem capitalizado, com cerca de 30% em caixa, aproveitou para ir às compras.
“No fim do dia, a crise foi positiva para o fundo, porque abriu uma boa oportunidade para comprar bons ativos baratos”, afirma Selegatto.
Com a valorização do mercado secundário de FIIs, Selegatto conta que virou a mão, aproveitando para vender ativos comprados no começo da crise, de forma a realizar lucro e comprar teses mais específicas.
Entre as novas aquisições do fundo, o gestor da Iridium cita fundos de papel como Devant Recebíveis Imobiliários e o próprio HCTR11.
Além de CRIs, que compõem a maior parte do portfólio, o fundo investe em cotas de outros fundos imobiliários. A maior parte dos ativos possui correção indexada ao IPCA (28%), com cerca de 15% indexados ao IGP-M.
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