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SÃO PAULO – A piora nas perspectivas para a economia brasileira, com um cenário traçado pelo mercado financeiro de desempenho mais fraco do PIB, inflação em alta e um câmbio cada vez mais pressionado, deve obrigar o Banco Central a iniciar o ciclo de alta dos juros nesta quarta-feira (17) em um ritmo acima do previsto inicialmente.
A mudança não deve significar, contudo, grande alívio para o investidor de perfil mais conservador saudoso da renda fixa local super rentável. Isso porque o processo de aperto monetário deve levar a taxa Selic para 4,5%, até dezembro, e para 5,5%, ao fim de 2022 (leia mais aqui).
Para manter, portanto, um rendimento real do portfólio, ou seja, acima da inflação corrente, além da Bolsa brasileira, os ativos globais despontam como um destino cada vez mais procurado pelos investidores brasileiros.
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E embora as estratégias de renda variável ainda sejam as mais populares, a classe da renda fixa no exterior também oferece oportunidades de diversificação do portfólio, com expectativa de rentabilidade acima da oferecida pelos juros de curto prazo no mercado local.
Além de nomes bastante familiares, por se tratar de grandes empresas brasileiras como Petrobras, Vale, Itaú e Cosan, o mercado global de renda fixa dá acesso a setores e regiões com perspectivas de crescimento bem melhores do que as encontradas hoje no país, por meio de companhias de tecnologia, turismo e consumo nos Estados Unidos.
A maior parte desses produtos faz o “hedge” do câmbio, ou seja, o retorno do investidor não fica exposto à variação do dólar contra o real, tendo como proposta entregar uma rentabilidade de aproximadamente 5%, além do CDI, embora a dispersão de rentabilidade no segmento seja alta.
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A má notícia é que, em sua maioria, os fundos que dão acesso à classe da renda fixa nos mercados internacionais estão restritos apenas ao investidor qualificado, aquele com mais de R$ 1 milhão em aplicações financeiras, por excederem o limite de 20% da alocação global permitida aos produtos para o público geral.
No leque ao alcance dos investidores mais abonados, estão veículos que concentram sua atuação em títulos grau de investimento ou de alto rendimento (“high yield”) nos mercados desenvolvidos, com destaque para as oportunidades nos Estados Unidos frente ao ritmo de crescimento da economia americana.
Entre eles, estão o Pimco Income e o AXA High Yield. Nesses produtos, pela gordura escassa nos ativos de maior qualidade como reflexo do vultuoso socorro financeiro nos mercados desenvolvidos, a busca tem se voltado para os ativos “high yield”, de maior expectativa de retorno e, consequentemente, com maior risco.
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Confira a seguir a rentabilidade como percentual do CDI de alguns dos fundos globais de renda fixa à disposição no mercado local desde o início de cada produto, bem como seu desempenho em 2020 e no primeiro bimestre de 2021.
América Latina
Há também aqueles fundos que têm como proposta não ir tão longe, em termos geográficos, de olho nas melhores oportunidades em títulos privados negociados no exterior, mas apenas de empresas da América Latina. Pelo tamanho do mercado brasileiro, as empresas locais costumam ter peso relevante nos portfólios.
No fundo de crédito global focado em América Latina da Octante Capital, por exemplo, Petrobras, Cosan e BB, além da mexicana Pemex, estão entre as maiores apostas na carteira.
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Segundo Laszlo Lueska, gestor da Octante, o fundo tem historicamente cerca de 70% da exposição em ativos brasileiros. Ele explica que, pela maior competição que as empresas nacionais precisam enfrentar para acessar os bolsos internacionais em comparação às ofertas realizadas localmente, em que os nomes de alta qualidade são muito mais restritos, o spread pago lá fora acaba sendo maior. Ainda que a emissão seja de uma mesma empresa e de prazo semelhante.
Como exemplo no portfólio, o gestor cita títulos perpétuos do Itaú, negociados no mercado secundário com taxa de aproximadamente 2,6% além do CDI, no caso dos ativos emitidos internamente, e de 4%, nos papéis internacionais. Os ativos perpétuos não contam com um prazo de vencimento predefinido, e remuneram os investidores de acordo com a evolução da receita da companhia.
“Lá fora o Itaú não compete apenas com os bancos brasileiros, mas com os bancos dos Estados Unidos , da América Latina, da Europa, da Ásia, da África”, afirma Lueska.
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No primeiro bimestre, o fundo teve perdas de 1,8%, principalmente pelo movimento de abertura das taxas dos juros nos Estados Unidos, parcialmente defendido por derivativos negociados na B3.
Para saber mais sobre a atuação da Octante e de outras gestoras para proteger a carteira em um momento de incerteza elevada, especialmente no cenário doméstico, confira esta matéria.
Debêntures da Vale
Também com a proposta de investir em títulos corporativos latino-americanos, o Quasar Latam Bonds teve valorização de 5,8% em 2020, que já chega a 4,1% apenas no primeiro bimestre de 2021.
Segundo Nathan Shor, gestor da Quasar, parte importante do resultado se deve à exposição de aproximadamente 20% da carteira em debêntures perpétuas da Vale, emitidas ainda na privatização da mineradora, em 1997.
O rendimento dos ativos da mineradora é de aproximadamente 8% ao ano, já feito o “hedge” do câmbio, beneficiado pelo momento positivo para o setor de commodities frente ao reaquecimento da atividade global.
Leia também:
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Além disso, no fim do ano passado, o BNDES, maior detentor, com cerca de 50% da emissão da mineradora, manifestou o desejo de se desfazer dos papéis, o que o gestor espera que ocorra ainda ao longo do primeiro semestre, contribuindo para aumentar a liquidez e o interesse dos investidores pelos títulos.
“Estamos otimistas com o ativo”, diz o gestor da Quasar, acrescentando que, pelo tamanho relevante da posição, não tem a intenção de aumentar a alocação na futura oferta do banco público.
Títulos emitidos no exterior da Cosan, com rendimentos próximo de 9% ao ano, e do BB e do banco mexicano Banorte, na casa dos 7%, também fazem parte da carteira do fundo da gestora.
“Risk-on”
Entre os pouco fundos globais de renda fixa com a variação do câmbio, está o Pimco Income. A versão dolarizada do veículo, ou seja, que está exposta ao desempenho da moeda americana, rendeu 35% em 2020, enquanto a versão que faz o “hedge” do câmbio teve valorização de 6,4%.
“Os ativos internacionais estão expostos a um conjunto diferente de fatores econômicos e políticos, o que os torna muito menos sensíveis ao desempenho da economia brasileira”, afirma Flora Meirelles, vice-presidente da Pimco para a região da América Latina e do Caribe.
Ela acrescenta ainda que a renda fixa global tem uma correlação significativamente menor com as ações brasileiras do que a renda fixa local, que responde mais aos fatores particulares do próprio país.
Em relatório do mês de fevereiro a respeito da estratégia Pimco Income, o CIO global da gestora, Daniel Ivascyn, apontou ser mais desafiador encontrar oportunidades nos nichos de mercado em que as medidas de socorro financeiro do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) se fazem mais presentes, como nos títulos de alta qualidade com rating grau de investimento.
“Por isso, ampliamos o leque de oportunidades, olhando taticamente para quase todos os setores dos mercados globais de renda fixa”, escreveu o especialista no documento, em que disse também que o fundo está provavelmente com a maior diversificação setorial histórica.
Hoje, escreveu o CIO da Pimco, o foco está voltado principalmente para os segmentos mais afetados pela pandemia, como hospitalidade e varejo.
Ivascyn afirmou ainda que “as oportunidades atreladas ao crédito imobiliário seguem bastante atraentes”, em um segmento que continua com fundamentos sólidos nos Estados Unidos e na Europa.
A Pimco também está construtiva com os mercados emergentes, que o CIO entende que devem ser uma importante fonte de diversificação para contribuir com o diferencial de retorno da estratégia.
Força americana
A gestora, que tem cerca de US$ 2,2 trilhões em ativos sob gestão e é conhecida pela expertise na renda fixa, está longe de estar sozinha na busca por mais risco em nome de retornos atraentes na classe.
Enquanto no Brasil o juro baixo é algo ainda relativamente recente, nos Estados Unidos, já se trata de uma realidade há mais de uma década, afirma Rafael Tovar, responsável pela distribuição offshore da gestora de origem francesa AXA nas Américas, com aproximadamente US$ 1 trilhão sob gestão.
Nesse contexto, explorar as oportunidades para além do óbvio nos títulos privados se mostra uma importante alternativa para a diversificação do portfólio, afirma o executivo, ao citar o fundo AXA US High Yield. O produto busca justamente oportunidades nos “bonds” globais de alto rendimento.
Embora as taxas já tenham diminuído consideravelmente em comparação aos momentos mais agudos da crise em 2020, quando chegaram aos dois dígitos, a leitura na gestora é de que os prêmios, hoje próximos de 4,5%, ainda são atraentes frente ao risco dos ativos, afirma Tovar, acrescentando que, nos papéis grau de investimento, o nível fica mais próximo de 1,5% nos mercados globais.
Com um foco voltado aos títulos “high yield” dos Estados Unidos, o fundo tende a se beneficiar do novo pacote trilionário de estímulos aprovado pelo governo americano, diz o executivo da AXA, que fica baseado em Nova York.
“Não há muitas regiões fora dos Estados Unidos, além da Ásia, com perspectivas tão positivas de crescimento”, afirma Tovar, que entende que, até maior que o risco de inadimplência dos investimentos, é o do aumento dos “treasuries“.
Para se proteger do risco de alta dos juros americanos, o fundo da AXA, que está com o foco mais voltado para o setor de tecnologia, tem adotado um perfil defensivo, com “duration” ao redor dos dois anos, abaixo dos três anos e meio nos principais benchmarks globais.
Preferência pelo hedge cambial
Fabiano Cintra, especialista em fundos internacionais da XP, explica que, devido ao nível mais baixo de volatilidade em comparação às ações, na renda fixa, o dólar acaba tendo na maioria das vezes um peso dominante para o resultado final.
“O investidor geralmente espera por uma volatilidade menor no produto de renda fixa, e quando o câmbio é adicionado, a volatilidade aumenta substancialmente”, assinala o especialista.
Por essa razão, diferentemente dos fundos internacionais de ações, em que é mais comum a exposição ao dólar, no caso dos produtos globais dedicados à renda fixa, a maior parte não fica exposta à oscilação da moeda, com algumas exceções, como o Pimco Income e o Oaktree Global Credit, em que há tanto a versão com e sem o “hedge” cambial.
Na XP, além dos cerca de 20 fundos de renda fixa internacionais voltados ao investidor qualificado, há duas opções da família “Trend”, que dão ao investidor de varejo acesso às oportunidades globais na classe.
São eles o Trend Tesouro Americano FIM, que acompanha o rendimento da curva de juros dos Estados Unidos de sete a 10 anos, e o Trend High Yield Americano FIM, que atua no segmento dos títulos de alto rendimento na região.
Ambos têm tíquete inicial de R$ 100 e acompanham, respectivamente, os ETFs da BlackRock “iShares 7-10 Year Treasury Bond” e “iShares iBoxx High Yield Corporate Bond ETF”.
“Apesar de os yields não serem os mais atraentes, os títulos do Tesouro americano são um dos principais porto-seguro do mercado”, diz Cintra, que, em linha com os pares, enxerga no segmento “high yield” as melhores oportunidades da renda fixa global para 2021.
Na carteira recomendada da XP aos clientes de perfil moderado, a exposição ao mercado internacional corresponde a 17% do portfólio, e tem entre as sugestões o fundo de “high yield” da AXA, o de crédito global da Oaktree e o da Moneda focado em títulos da América Latina. Para o investidor de perfil agressivo, a carteira recomendada da XP aponta para 30% de alocação internacional.