Retornos de fundos com ações da Americanas recuam até 9,5% dois dias após descoberta de rombo contábil

Entre os fundos classificados como ações livre, a mediana de rentabilidade entre os dias 11 e 13 chegou a -0,45%, contra -1,42% do Ibovespa

Bruna Furlani

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A sangria vista nas ações das Americanas (AMER3) nos últimos dias teve reflexo em fundos com exposição aos papéis da empresa. Ao olhar para os retornos, é possível perceber que as perdas chegaram até 9,5% entre os dias 11 e 13 de janeiro. O levantamento foi feito pela Economatica a pedido do InfoMoney. Na semana passada, as ações da empresa recuaram mais 70%.

A rentabilidade negativa é fruto da descoberta de “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões na empresa, mas documentos enviados à Justiça mostram que a dívida bruta estimada pode chegar a R$ 40 bilhões.

No topo da lista dos fundos mais afetados negativamente está o Lato Ações FIA, da Lato Capital, que registrou um recuo de 9,44% entre os dias 11 e 13 de janeiro. O levantamento é da Economatica.

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Segundo os dados disponíveis no estudo, é possível auferir que quase 5% do patrimônio líquido do fundo estava alocado nos papéis da companhia por meio de uma posição comprada, ou seja, que aposta na valorização das ações. Os dados são de setembro de 2022.

Ao ser questionada pela reportagem, a Lato Capital informou que encerrou a posição que detinha em Americanas na abertura do mercado na última quinta-feira (12).

Na sequência, o maior recuo foi registrado pelo Moat Brasilprev Fife FIA, da Moat Capital, com queda de 9,31%. De acordo com o estudo da Economatica, o percentual alocado em ações da empresa correspondia a 12,69% do patrimônio líquido do fundo em setembro de 2022.

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Em nota, a Moat Capital informou que encerrou as posições de todos os seus fundos em ações ordinárias das Lojas Americanas. A casa também destacou que fará tudo para “resguardar nossos direitos pelas perdas enquanto éramos acionistas minoritários”.

No estudo foram levados em conta fundos multimercados e de ações com posição nos papéis da empresa, seja via ações, opções ou termo em setembro do ano passado. Foram descartados fundos com alocação superior a 90% da carteira em papéis da Americanas entre os meses setembro e dezembro de 2022.

Entre os fundos classificados como ações livre pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), é possível perceber que a mediana de rentabilidade entre os dias 11 e 13 chegou a -0,45%, contra um retorno negativo de 1,42% do Ibovespa (índice de referência dessa classe de ativos).

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Uma das hipóteses para obter um desempenho um pouco melhor do que o do Ibovespa é que os fundos de ações poderiam estar com baixa exposição aos papéis da varejista ou que boa parte dos produtos estivesse com portfólios mais pulverizados na data.

Já no caso dos fundos classificados como multimercados pela Anbima, o ponto médio de retorno entre os dias 11 e 13 ficou negativo em 0,51%, contra 0,10% do CDI (taxa de referência nessa classe de ativos) durante o período.

Ao olhar para as perdas registradas nos últimos dias, Rodrigo Sgavioli, Clara Sodré e Nathália de Sá, da XP, reforçam, em relatório, a necessidade de adotar uma postura cautelosa com o objetivo de evitar grandes movimentações no portfólio que prejudiquem a carteira no longo prazo.

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“Recomendamos seguir com um portfólio diversificado, buscando informações e dados tanto quantitativos quanto qualitativos que tragam sempre maior convicção em relação aos fundos alocados em carteira”, destacam.

Para eles, mais do que nunca, é importante buscar fundos de gestão ativa em que o gestor é responsável por montar posições com foco em mitigar os efeitos negativos da queda nos preços das ações.

Americanas deixa de pagar juros de uma série de debêntures

Para além do impacto sobre as ações da empresa, títulos de dívida da empresa estão sob o olhar atento dos investidores nos últimos dias, diante da piora nas perspectivas para a varejista.

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Nesta terça-feira (17), por exemplo, a Americanas (AMER3) informou que deixou de pagar os juros remuneratórios da 17ª emissão de debêntures. O pagamento estava previsto para ser realizado na segunda (16), de acordo com o fato relevante assinado pelo diretor presidente, João Guerra.

O papel em questão tem o código LAMEA7, segundo informações disponíveis no site da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). O título é atrelado ao CDI (taxa de referência da renda fixa) e a emissão dos papéis ocorreu em julho de 2022. Na época, a captação foi de R$ 2 bilhões.

No documento, a empresa informou que a medida é consequência da decisão proferida pela 4ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ). Na sexta-feira (13), o juiz Paulo Assed concedeu uma medida de tutela de urgência cautelar a pedido da Americanas contra o vencimento antecipado de dívidas.

A decisão deu fôlego para a empresa enfrentar uma crise sem precedentes após ter anunciado um rombo contábil de R$ 20 bilhões, podendo chegar a R$ 40 bilhões. Além, disso, após a decisão, o TJRJ deu 30 dias corridos para a Americanas entrar com pedido de recuperação judicial.

Segundo o documento, tendo em vista o que consta na decisão da Justiça, a exigibilidade dos juros previstos na cláusula 4.2.2 da escritura da 17ª emissão de debêntures da companhia encontra-se “suspensa”.

Piora na classificação de risco de crédito

Após a descoberta de “inconsistências contábeis” no balanço da empresa na semana passada, a classificação de risco de crédito (rating) da varejista por agências piorou bastante.

Nesta terça-feira (17), a agência de classificação de risco Fitch Ratings voltou a cortar a nota de crédito da Americanas (AMER3), dessa vez de ‘CC’ para ‘C’, após a varejista conseguir liminar na Justiça que a protege por 30 dias contra vencimento antecipado de dívidas, prazo que a varejista poderá usar para obter um acordo com credores ou pedir uma recuperação judicial.

“No caso de a Americanas anunciar formalmente um plano de reestruturação, os ratings serão rebaixados para ‘RD’ para refletir um default [calote] restrito ou ‘D’ se a empresa entrar com pedido de recuperação judicial”, afirmou a Fitch em relatório. A agência já tinha reduzido a nota da Americanas na sexta-feira (13) após o anúncio das inconsistências contábeis.

A Fitch afirma que a estrutura de capital da Americanas é considerada insustentável com um acréscimo estimado de R$ 20 bilhões em novos passivos, conforme anunciado pela empresa há alguns dias.

Esse número, acrescentou, se compara a R$ 3,2 bilhões de Ebitda no acumulado em 12 meses e R$ 15,4 bilhões de patrimônio líquido no final de setembro de 2022. “O passivo adicional anunciado quase dobrou o cálculo da Fitch da dívida líquida ajustada da empresa para R$ 46 bilhões, de 26 bilhões.”

A agência também afirmou que “a estrutura de capital insustentável e a reputação prejudicada” da Americanas prejudicam gravemente sua flexibilidade financeira e capacidade de lidar com obrigações operacionais e financeiras. “O apoio dos credores será fundamental para melhorar sua flexibilidade.”

Operacionalmente, a Americanas pode ter dificuldades para manter alguns de seus atuais fornecedores, disse a Fitch. “Uma injeção de capital material em tempo hábil para evitar a inadimplência é altamente crucial, embora incerta. A capacidade da Americanas de levantar caixa por meio da venda de ativos e desinvestimentos será testada e poderá minimizar as perdas dos credores.”

Mais cedo, a agência de classificação de risco S&P Global Ratings havia rebaixado a Americanas em sua classificação de crédito em escala global e em escala nacional para “D”, de default (calote).