Temor com crise no Credit Suisse respinga na CSHG, que perde fundos para outros bancos e gestoras

Um total de 104 fundos exclusivos originalmente geridos pela CSHG já foram transferidos para outras instituições financeiras ao longo de 2022

Mariana Segala

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Os desdobramentos da crise global enfrentada pelo Credit Suisse começam a respingar também no mercado financeiro brasileiro. A gestora Credit Suisse Hedging-Griffo, mais conhecida como CSHG, controlada pelo tradicional banco suíço, está perdendo fundos para outros bancos e gestoras.

O movimento se concentra nos fundos exclusivos, que possuem apenas poucos investidores, não estando abertos para o público em geral. As carteiras costumam ser utilizadas como ferramenta para as atividades de gestão de fortunas (wealth management), expertise da gestora. Em geral, abrangem os recursos de indivíduos ou famílias endinheiradas, que têm demonstrado descontentamento – além de receio – com a situação enfrentada pela matriz, segundo executivos de outras gestoras ouvidos pelo InfoMoney.

Um total de 104 fundos exclusivos originalmente geridos pela CSHG foram transferidos para outras instituições financeiras ao longo deste ano, até a última quarta-feira (16). As carteiras têm patrimônio entre R$ 5 milhões e R$ 790 milhões, segundo dados da plataforma Comdinheiro, e migraram tanto para grandes bancos quanto para gestoras de nicho e family offices.

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No mesmo período de 2021, outros 88 fundos da CSHG já haviam mudado de gestor. Ainda não configura uma sangria – mas, de acordo com um executivo que preferiu não se identificar, o número pode crescer nos próximos poucos meses. “Não há prazo regulatório para a transferência de fundos exclusivos. Após acertada a migração, o processo pode demorar de dois a três meses porque envolve muitos prestadores de serviços [como administradores] que precisam conversar”, afirma. A movimentação só se refletirá nas estatísticas daqui a um tempo.

Em outubro, quando os temores em torno da solvência do Credit Suisse se intensificaram globalmente, a CSHG registrou resgates líquidos (descontados os depósitos) de R$ 3,4 bilhões, considerando todos os seus fundos, exclusivos ou não. A gestora é a 11ª em patrimônio líquido, segundo levantamento da plataforma Quantum, mas teve o quarto maior volume de saques no mês. O número de cotistas caiu para 28,5 mil no início de novembro, quase 3 mil a menos do que registrava seis meses antes, mostram dados coletados na plataforma Trademap.

Segundo outro gestor consultado pelo InfoMoney, o problema no caso da CSHG é menos o risco de crédito da instituição – já que cada fundo possui CNPJ próprio e, por isso, os recursos dos investidores fica segregado do patrimônio da gestora – e mais a capacidade de gestão.

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“A tripulação que veleja o barco está indo embora, é um risco mais relacionado às pessoas do que à possibilidade de falência. O cliente não quer esperar para ter uma equipe pior gerindo seu dinheiro”, diz. Segundo ele, funcionários de segundo e terceiro escalão têm se aproximado de outras instituições financeiras em busca de recolocação, temendo desfecho pior para suas carreiras.

Isso também ajuda a explicar por que a migração dos fundos para outras casas está acontecendo aos poucos. Os clientes da CSHG têm procurado conhecer melhor as equipes das novas gestoras antes de optar por uma delas. “É uma movimentação lenta”, diz um gestor. “São clientes que não estavam na CSHG pelo produto bancário, e sim pelo perfil da gestão. Sua demanda é por outros gestores com o mesmo grau de sofisticação”, completa outro.

É diferente do que se viu nos fundos imobiliários geridos pela CSHG nos primeiros dias de outubro, que registraram repentina elevação da volatilidade na B3. Em resposta aos rumores sobre eventuais prejuízos para os FIIs, a gestora se pronunciou na época, numa tentativa de conter o estrago. Em comunicado ao mercado, reforçou que os bens e direitos integrantes do patrimônio dos fundos, “em especial os bens imóveis mantidos sob a propriedade fiduciária da instituição administradora, bem como seus frutos e rendimentos, não se comunicam com o patrimônio desta”.

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Diante da segregação do patrimônio, os resultados e a distribuição de dividendos dos FIIs administrados pela corretora seguirão normalmente, “uma vez que os recebimentos de locações, créditos e todos os demais direitos dos FIIs não têm correlação e não são compostos por títulos de emissão do Grupo Credit Suisse”, segundo a instituição.

Entenda o caso

Os temores quanto ao futuro do banco não são um privilégio da CSHG – afetam principalmente a matriz. Nas primeiras semanas do quarto trimestre, clientes do Credit Suisse resgataram mais de US$ 88 bilhões, noticiou a agência Bloomberg. Nesta quarta-feira (23), o banco anunciou que deve ter um prejuízo de US$ 1,6 bilhão no trimestre.

Notícias negativas vêm abalando globalmente a credibilidade do Credit Suisse há algum tempo. O banco suíço sofre as consequências de duas grandes crises: o colapso da empresa financeira britânica Greensill e do fundo de multimercado americano Archegos.

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Primeiro, o Credit Suisse perdeu mais de US$ 10 bilhões em investimentos dos clientes em produtos da financeira inglesa Greensill, que faliu em março de 2021. No mesmo ano, penou com empréstimos de US$ 30 bilhões para o Archegos, que tomava crédito para bancar operações no mercado financeiro – mas acabou caminhando também para a falência após uma aposta errada nas ações da ViacomCBS.

Mais recentemente, as preocupações voltaram a crescer, dado que a deterioração das condições macroeconômicas globais poderiam prejudicar os preços dos negócios e ativos que o banco planeja vender para elevar sua liquidez.

Há cerca de um ano, a instituição prometeu uma reestruturação, e anunciou mais uma no mês passado. O novo plano inclui a venda de parte do grupo de produtos securitizados do banco para as casas de investimento americanas PIMCO e Apollo Global Management, além da redução do banco de investimento por meio de um spin-off (cisão) dos mercados de capitais e da unidade de consultoria, que será renomeada como CS First Boston. Fora isso, há ainda a venda de sua participação no Allfunds Group, listado em Amsterdã, na Holanda.

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Para financiar a revisão estratégica do banco, os acionistas do Credit Suisse aprovaram hoje um aumento de capital de cerca de US$ 4,2 bilhões.

Procurada pelo InfoMoney, a CSHG informou, por meio de nota, que há “um inequívoco foco nas atividades de Wealth Management e nos mercados com alto potencial de crescimento como o Brasil”. Segundo a gestora, o Brasil continua sendo “absolutamente foco” para o Credit Suisse. “Nos últimos anos, nossa operação para clientes brasileiros (onshore e offshore) cresceu 15% ao ano em média”, diz a nota. A meta é dobrar o tamanho da operação no País nos próximos três a cinco anos.

Mariana Segala

Editora de Investimentos do InfoMoney