Tesouro Direto: juros de prefixados batem novo recorde após medidas para baixar preço de combustível

Na leitura de alguns agentes de mercado, proposta tem forte impacto inflacionário no curto prazo, mas possui grande custo fiscal

Bruna Furlani Katherine Rivas

Notas de real (Crédito: Shutterstock)
Notas de real (Crédito: Shutterstock)

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As taxas dos títulos públicos apresentaram movimento de alta na tarde desta terça-feira (7). Nos prefixados, a rentabilidade oferecida pelos títulos avançava até 24 pontos-base. Nos títulos atrelados à inflação as taxas subiam até 5 pontos-base.

Segundo Luciano Costa, economista e sócio da Monte Bravo Investimentos, as taxas subiram por conta de fatores domésticos, principalmente risco fiscal.

Ele explica que o mercado reagiu negativamente ao anúncio feito pelo governo ontem em relação às medidas para compensar a alta dos combustíveis. “O mercado está colocando uma deterioração fiscal como risco principal dessas medidas”, avalia.

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Costa afirma que a admissão dos impostos federais no preço da gasolina deve trazer uma perda de arrecadação de R$ 16 bilhões em troca de uma queda na inflação de 0,7%, contudo com piora no fiscal. O governo teria anunciado também uma regra de compensação para a perda de arrecadação dos estados com diesel e gás da cozinha.

“Agora você tem um governo se dispondo a cobrir em torno de R$ 22 bilhões de impacto. Somado a impactos menores do etanol e outros cortes de impostos, o impacto final será de R$ 40 bilhões da União – com essas isenções e a cobertura do impacto negativo dos estados”, explica Costa.

Na visão do economista, o mercado apresenta diversas dúvidas sobre esta situação. “Não sabemos se o governo no final pode ter que comprometer mais do que ele está esperando”, avalia.

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Costa destaca que no Senado ainda está pendente a votação do imposto ICMS e que não há clareza se a medida de compensação deve ocorrer antes ou depois de o projeto ser aprovado.

Em relatório enviado a clientes, Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset, destacou que o impacto inflacionário de curto prazo que tais projetos trazem é “inegável”. “Porém, o custo fiscal ao resultado do Tesouro certamente pressionará ainda mais os juros”, defendeu.

Em sua análise, o economista-chefe da casa disse que a compensação anunciada por Bolsonaro foi feita sem fonte de reposição, conforme prevê a lei, e que o governo vem mostrando que busca alternativas nada ortodoxas para a redução no preço dos combustíveis.

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Dentro do Tesouro Direto, o título prefixado de médio prazo apresentava a maior alta entre as taxas. O Tesouro Prefixado 2029 oferecia às 15h33 uma rentabilidade anual de 12,80%, superior aos 12,56% da segunda-feira.

Já o Tesouro Prefixado 2033, com juros semestrais, apresentava na última atualização do dia um retorno anual de 12,92%, acima dos 12,70% registrados ontem.

Ambos os títulos bateram novos recordes. Estes passaram a ser negociados em fevereiro deste ano.

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Já o Tesouro Prefixado 2025 entregava uma rentabilidade anual de 12,73%, acima dos 12,57% de ontem.

Nos títulos atrelados à inflação, a maior alta era nas taxas do Tesouro IPCA+ 2026. O título público oferecia um ganho real de 5,54%, acima dos 5,49% da sessão anterior.

Os outros títulos apresentavam uma alta das taxas de entre 3 e 4 pontos-base.

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Confira os preços e as taxas de todos os títulos públicos disponíveis para compra no Tesouro Direto na tarde desta terça-feira (7): 

Fonte: Tesouro Direto

ICMS e reajuste salarial

Na cena política, investidores repercutem o anúncio de ontem do presidente Jair Bolsonaro (PL). As medidas para reduzir o preço dos combustíveis agora serão encaminhadas no formato de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) – proposição legislativa com tramitação mais complexa no parlamento.

“Essas foram as propostas que foram colocadas à mesa hoje para os dois presidentes das casas, e eles levarão aos senhores deputados e senadores. Havendo entendimento por parte dos senhores senadores, em aprovar o projeto de lei complementar e em promulgar, de forma bastante rápida, uma emenda à Constituição, isso se faria valer imediatamente na ponta da linha para os consumidores”, afirmou.

Por tramitarem como PECs, as medidas precisarão do aval de 3/5 dos deputados (ou seja, 308 dos 513 integrantes) e do mesmo quórum entre os senadores (49 de 81), em dois turnos de votação em cada casa legislativa. Somente depois disso poderão ser promulgadas pelo Congresso Nacional. O texto pode ser modificado pelos parlamentares sem possibilidade de veto presidencial.

Na prática, a proposta deverá abrir caminho nas regras fiscais vigentes para autorizar que os recursos necessários para tais compensações fiquem fora do teto de gastos – regra que limita o avanço de boa parte das despesas públicas à inflação.

Além dos combustíveis, outro tema que segue em pauta é o reajuste ao funcionalismo público. O presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques, no entanto, afirmou que a decisão do governo Jair Bolsonaro (PL) de “empurrar” a definição sobre o reajuste de servidores federais indica que o Executivo já decidiu por não dar aumento ao funcionalismo este ano.

Ontem (6), o Ministério da Economia informou que vai usar a reserva de R$ 1,7 bilhão no Orçamento destinada ao reajuste para abater o volume de contingenciamento necessário para cumprir o teto de gastos neste ano (o governo precisa congelar R$ 8,702 bilhões, mas com o uso da reserva o bloqueio efetivo ficou em R$ 6,965 bilhões).

Perspectivas para os juros

As propostas anunciadas pelo governo na segunda-feira (6) para tentar reduzir o preço dos combustíveis e a inflação deste ano poderiam pressionar ainda mais os juros e forçar o Banco Central a postergar o ciclo de cortes da taxa básica de juros (Selic) em 2023. Essa é a avaliação feita por especialistas ouvidos pelo InfoMoney.

O presidente Jair Bolsonaro (PL) anunciou que o governo apresentará uma proposta emenda à constituição (PEC) que vai compensar os estados que aceitarem zerar o ICMS sobre diesel e gás de cozinha. A medida, que vale até dezembro de 2022, ficaria condicionada à aprovação pelo Senado do Projeto de Lei Complementar (PLP) 18/2022, que já passou pela Câmara há duas semanas e estabelece teto de 17% para o ICMS sobre combustíveis e energia elétrica, entre outros itens.

Para gestores e economistas, a PEC teria um custo fiscal alto, já que seria muito difícil que um novo governante conseguisse reverter os benefícios no próximo ano. E para reduzir a inflação em 2022, também acabaria pressionando a inflação de 2023.

Veja também:

Medidas para baixar preço dos combustíveis podem forçar BC a postergar redução da Selic

“Se houver a aprovação da PEC e do PLP 18, o impacto poderia chegar a 230 bps [2,30 ponto percentual] na inflação deste ano. Mas no ano que vem, 90 bps [0,90 ponto percentual] deveriam ser revertidos de volta”, diz Juliano Ferreira, estrategista-chefe da BGC Liquidez. Os cálculos são preliminares e englobam a intenção do governo de zerar impostos federais (PIS/Cofins e Cide) sobre o etanol e gasolina neste ano, também anunciada ontem.