Tesouro Direto: mercado foca nas possíveis mudanças nas metas de inflação; juros de títulos atrelados à inflação chegam a 6,52%

Nesta 5ª, dois títulos atrelados à inflação estão com as negociações suspensas devido ao pagamento do cupom semestral

Bruna Furlani Neide Martingo

Notas de reais (Sidney de Almeida/Getty Images)
Notas de reais (Sidney de Almeida/Getty Images)

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A quinta-feira (9) foi marcada por muita turbulência no mercado. Tanta, que os negócios foram paralisados nesta manhã, por aproximadamente meia hora, e normalizados às 12h10. Às 17h03, última atualização de hoje, os juros dos títulos prefixados apresentavam alta. O destaque era o Prefixado 2033, com 13,60%, bem acima dos 13,37% desta quarta-feira (8), diferença de 23 pontos-base (0,23 ponto percentual).

Os retornos dos títulos atrelados à inflação registravam avanço também, como o IPCA+2029, com 6,24%, acima dos 6,21% da véspera. O título que oferecia maior retorno era o IPCA+2045, de 6,52%, superior ao visto ontem, de 6,43%.

Dois títulos atrelados à inflação tiveram a negociação suspensa a partir desta quinta-feira, devido ao pagamento do cupom semestral, que ocorre na próxima quarta-feira (15).

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Por regra do Tesouro Direto, o investimento em títulos que têm cupom de juros é suspenso quatro dias úteis antes da data do pagamento. Da mesma forma, há mudanças nos resgates, que são interrompidos dois dias úteis antes do pagamento do cupom.

A volatilidade está ligada à aversão a risco provocada pela notícia de que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, sinalizou a integrantes do governo um leve aumento na meta de inflação deste ano, de 3,25% para 3,5% na próxima reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN). As apurações são do Metrópoles e da Bloomberg.

Hoje a meta estabelecida para 2023 é de 3,25%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.

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O líder do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Câmara dos Deputados, José Guimarães (PT-CE), disse hoje que o Banco Central “precisa entender que o Brasil tem uma nova gestão e que há uma nova política econômica em curso no país”.

Em entrevista à CNN Brasil, Guimarães fez coro às críticas de Lula ao atual patamar da taxa de juros, de 13,75% ao ano, e afirmou considerar uma “boa ideia” chamar o presidente do BC, Roberto Campos Neto, para debater o tema no Congresso. Ao mesmo tempo, o líder disse que a independência formal do Banco Central, prevista em lei, não está em discussão.

“O problema da mudança de meta é a mensagem que o governo manda. A reação de hoje é um exemplo do que acontece a esse tipo de informação”, explica Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos. “Se houver de fato uma mudança na meta de 2023, acho que sair de 3,25% para 3,50% não muda muita coisa em relação ao fato de o BC conseguir ou não ficar dentro da meta. O problema é a sinalização que este tipo de atitude manda, dizer claramente que o governo vai buscar ter uma inflação mais alta, ou seja, tentando influenciar o BC a baixar os juros, por meio de medidas fiscais e parafiscais”.

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Ele projeta que, “no fim, teremos a abertura das taxas de juros. Mesmo que o BC baixe a Selic na marra, os juros de longo prazo continuarão elevados. Isso acaba sendo muito ruim para planejar investimentos no país, tanto faz se é investidor local ou estrangeiro. Nos mercados isso vai se traduzir em dólar mais forte, juros altos (curva) e bolsa em queda”.

Já Carlos Hotz, planejador financeiro e sócio fundador da A7 Capital, ressalta que hoje o Tesouro Nacional fez um leilão de títulos públicos para o investidor estrangeiro. “Foi um volume importante de compra. Isso pode, talvez, corroborar para a visão de que. provavelmente, possamos ter um alívio na questão das taxas daqui para frente, caso aconteça de fato o cessar fogo entre governo e Banco Central”, detalha.

Investidores também acompanharam nesta quinta-feira a divulgação dos dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que subiu 0,53% em janeiro ante dezembro, quarto mês seguido de alta. Nos últimos 12 meses, o IPCA acumula avanço de 5,77%. Ambos os dados ficaram abaixo do consenso Refinitiv.

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Confira os preços e as taxas dos títulos públicos disponíveis para a compra no Tesouro Direto na tarde desta quinta-feira (9): 

Tesouro Direto
Fonte: Tesouro Direto

Mudanças nas metas

De acordo com o Metrópoles, a possível mudança da meta poderá ser proposta por Campos Neto na próxima reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), colegiado responsável por decidir sobre o assunto. O encontro está previsto para 16 de fevereiro.

Segundo a reportagem, integrantes da equipe econômica ressaltam, porém, que a mudança da meta de 2023 para 3,5% só faria sentido se o percentual também fosse replicado para a meta de inflação de 2024. Hoje, a meta para o próximo ano é de 3%.

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O InfoMoney entrou em contato com o Banco Central, mas a autoridade disse que não irá comentar o assunto.

IPCA

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o grupo de Alimentação e bebidas (0,59%) exerceu o maior impacto positivo sobre o IPCA em janeiro, contribuindo com 0,13 ponto percentual (p.p.), com grande influência dos subitens batata-inglesa (14,14%) e cenoura (17,55%).

“As altas nesses dois casos se explicam pela grande quantidade de chuvas nas regiões produtoras. Por outro lado, observamos queda de 22,68% no preço da cebola, por conta da maior oferta vindo das regiões Nordeste e Sul, item que teve alta de mais de 130% em 2022”, explicou em nota o gerente da pesquisa, Pedro Kislanov.

O grupo dos transportes (0,55%) exerceu o segundo maior impacto positivo sobre o índice geral, contribuindo com 0,11 p.p. em janeiro, com maior pressão dos combustíveis, que  registraram alta de 0,68%. “Os destaques foram a gasolina, com alta de 0,83%, o emplacamento e licença, que incorporou pela primeira vez a fração referente ao IPVA de 2023, com alta de 1,60%, e o automóvel novo, com aumento de 0,83%”, disse Kislanov.

Houve desaceleração no grupo de Saúde e cuidados pessoais (de 1,60% em dezembro para 0,16% em janeiro). O gerente da pesquisa destacou que o item que mais impactou neste resultado foi o de higiene pessoal, com recuo de 1,26%. O  resultado foi explicado pela queda nos preços de perfumes e artigos de maquiagem, devido a descontos.

Dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados pelo IBGE, apenas Vestuário apresentou variação negativa (-0,27%). “Cabe registrar que foi a primeira queda no grupo após 23 meses seguidos de altas, com a última retração tendo sido registrada em janeiro de 2021”, disse Kislanov.

O recuo em janeiro, segundo ele, se deve ao fato de várias lojas terem aplicado descontos sobre os preços que foram praticados em dezembro, para o Natal. O fator que mais influenciou no resultado foi uma queda de 1,37% no item de roupas femininas.

Ao olhar os dados, Felipe Rodrigo de Oliveira, economista da MAG Investimentos, diz que a surpresa do indicador ficou por conta da deflação vista no grupo Vestuário (-0,27%) e no item higiene pessoal (-1,26%).

Para fevereiro, o economista espera uma aceleração da variação mensal, em função da sazonalidade do reajuste nas mensalidades escolares, que são capturadas no IPCA desse mês.

Contudo, o profissional acredita que, para os próximos meses, o indicador do acumulado em 12 meses deverá manter seu processo de desaceleração até junho, em resposta às menores inflações mensais na comparação com os mesmos meses do ano passado.

Autonomia do BC e viagem de Lula aos EUA

Na cena política, líderes petistas na Câmara decidiram ontem (8) apoiar o convite para que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, vá ao Congresso explicar a política de juros da instituição. Nos últimos dias, Lula intensificou as críticas à atuação da autoridade monetária.

Após uma reunião da base aliada, o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), disse que assinou um requerimento de urgência apresentado pelo PSOL para que Campos Neto seja convidado a dar explicações na Câmara sobre a taxa básica de juros, a Selic, mantida em 13,75% na semana passada pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do BC. Líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE) afirmou que também vai assinar o documento.

A aprovação do requerimento de urgência é necessária para que o convite a Campos Neto seja votado no plenário de imediato. O pedido foi apresentado pelo líder do PSOL na Câmara, Guilherme Boulos (SP), que espera que a votação ocorra na semana que vem. O deputado também tem expectativa de que mais lideranças da base governista assinem o documento até a próxima terça-feira (14) depois de consultarem suas bancadas.

Já o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou que a autonomia do Banco Central é um avanço que afasta critérios políticos de algo que tem um aspecto técnico muito forte. De acordo com ele, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, é um homem bem preparado.

“Vamos buscar cuidar das questões do País e enfrentar os problemas dentro dessa realidade que existe, dessa autonomia do Banco Central, e buscar criar as pontes necessárias entre as pessoas envolvidas para que a gente possa ter um propósito comum bem-sucedido”, declarou Pacheco, na noite de quarta.

Ao classificar Campos Neto como um homem preparado, o senador também citou a determinação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em conferir estabilidade ao País. Na avaliação dele, ambos são pessoas de boa intenção. “Quando homens de boa intenção se reúnem, os problemas se resolvem”, disse.

Também na cena política, o presidente Lula viaja nesta quinta-feira (9) aos Estados Unidos para um encontro com o presidente norte-americano, Joe Biden.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, a reunião será na sexta-feira (10) na Casa Branca, em Washington. Lula ainda se reunirá com deputados, senadores e líderes sindicais americanos.