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SÃO PAULO – Após sucessivos embates públicos, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) comunicou, nesta quinta-feira (16), a demissão de Luiz Henrique Mandetta do comando do Ministério da Saúde. O movimento era aguardado desde a semana passada e foi confirmado em uma reunião convocada às pressas pelo presidente nesta tarde.
Para comandar a pasta, o presidente escolheu o oncologista e empresário Nelson Teich, com quem se reuniu mais cedo. Formado pela UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e especializado em oncologia no Inca (Instituto Nacional do Câncer), ele é sócio de uma consultoria de serviços médicos. Nas eleições de 2018, chegou a atuar como consultor informal da campanha de Bolsonaro. Nesta crise do coronavírus, defende o “isolamento horizontal” como medida eficaz no enfrentamento da doença – em contraste com a opinião do presidente.
Pelo Twitter, Mandetta confirmou a saída, agradeceu a oportunidade de comandar a pasta e planejar o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. O agora ex-ministro também à sua equipe e desejou boa sorte ao novo comandante da pasta.
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Acabo de ouvir do presidente Jair Bolsonaro o aviso da minha demissão do Ministério da Saúde.
Quero agradecer a oportunidade que me foi dada, de ser gerente do nosso SUS, de pôr de pé o projeto de melhoria da saúde dos brasileiros e— Henrique Mandetta (@mandetta) April 16, 2020
Agradeço a toda a equipe que esteve comigo no MS e desejo êxito ao meu sucessor no cargo de ministro da Saúde. Rogo a Deus e a Nossa Senhora Aparecida que abençoem muito o nosso país.
— Henrique Mandetta (@mandetta) April 16, 2020
Logo após a reunião, Mandetta fez um pronunciamento a servidores da pasta e à imprensa, na qual agradeceu a equipe, pediu esforços na condução da transição ao sucessor. O ex-ministro também chamou atenção para os desafios que ainda estão por vir no enfrentamento da pandemia do novo coronavírus, falou da relação com Bolsonaro e fez prognósticos para o futuro.
Mandetta voltou a defender a necessidade do isolamento social e alertou para a evolução da doença nas próximas semanas. Segundo ele, o país não está livre de um pico e o sistema de saúde não está preparado para “uma marcha acelerada”. Veja os principais pontos:
1. Mensagem aos servidores
“Não tenham medo. Não façam um milímetro diferente do que sabem fazer. Eu deixo este Ministério da Saúde com muita gratidão ao presidente por ter me nominado e ter permitido que eu nomeasse cada um de vocês. Eu deixo este ministério, mas sei o que deixo. Sei que deixo aqui a melhor equipe. Trabalhem para o próximo ministro tal qual trabalharam por mim. Ajudem, não meçam esforço. Desdobrem seus esforços para que eles tenham o melhor espaço possível para trabalhar. Alertem, conversem, dialoguem”.
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“Nada tem significado que não seja uma defesa intransigente da vida, uma defesa intransigente do SUS e uma defesa intransigente da ciência. Fiquem nos três pilares, que desses pilares vocês conquistarão tudo. Porque eles alimentam a verdade. A ciência é a luz, é através dela que vamos sair”.
2. Novo ministro
“Às vezes, isso é uma grande oportunidade. Uma equipe que vem e que pensa diferente, e uma visão diferente que pode mudar o pensamento de cada um de vocês”.
“Tenham a mais absoluta certeza que a gente fez e lutou um bom combate até aqui. Só que estamos só no meio, só no começo da batalha. E se eu deixo um pouco esse cenário e vocês que têm que ficar por força do ofício, sabem que ministros passam e o que fica é o trabalho do servidor do Ministério da Saúde. Vocês agora são responsáveis de fazer essa transição, que ela seja suave profícua, que tenhamos um bom resultado ao término disso tudo”.
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3. Saúde universal
“Temos muito para dizer para o mundo sobre essa experiência magnífica de um país em desenvolvimento ter tido coragem de escrever na constituição que saúde é um direito de todos e que é um dever do Estado brasileiro. O mundo deveria copiar essa frase e pôr nas suas constituições para ver se a gente ganha um pouco de dignidade nesse século XXI, que começa agora”.
4. Futuro
“Muitas verdades que eram absolutas virarão pó. Muitas certezas serão questionadas. Muitos mercados florescerão e outros desaparecerão. O modo de viver será diferente. O relacionamento social humano será diferente. As videoconferências, o distanciamento será a tônica. Nós vamos ter que repensar muita coisa em termos do que queremos desta vida, qual estilo de vida vamos levar e como vamos tocar essa experiência que nos é dada por um período breve, de 80, 100 anos, mas que se traduz na permanência nossa e das nossas próximas gerações. Vamos procurar pensar bem mais nas próximas gerações”.
“A gente vê que não pode deixar ninguém para trás mesmo. A vida hoje de uma pessoal na Cracolândia tem o mesmo significado quando ela competir pelo leito de CTI do homem mais rico deste país”.
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5. Combate ao coronavírus
“Não pensem que estamos livres de um pico desta doença. O sistema de saúde ainda não está preparado para uma marcha acelerada. Sigam as orientações das pessoas mais próximas que estão em contato com o sistema de saúde, que são os prefeitos, governadores e o próprio Ministério da Saúde. O momento ainda é de todos darmos as mãos e vamos juntos, porque vai ser bem dura a tomada de decisão que vamos ter que fazer nos próximos meses”.
6. Presidente
“Agradeço muito o presidente. A conversa que tive com ele hoje foi extremamente amistosa, agradável, embora o que eu posso entregar agora a condução do ministério, é melhor que ele organize uma equipe que possa construir um outro olhar e que isso possa ser feito também na ciência. Sei da dificuldade, do peso da responsabilidade dele, do peso que é decidir em que momento a economia deve retomar sua normalidade, o impacto disso no emprego de milhões de pessoas. O presidente é extremamente humanista, ele pensa também nesse momento todo pós-corona”.
https://www.youtube.com/watch?v=xqE7gAqFpjU
Desencontros com o presidente
As últimas semanas foram de tensão entre o presidente e o agora ex-ministro, em meio às discordâncias sobre as medidas para combater o novo coronavírus. De acordo com o mais recente boletim do ministério, divulgado hoje, o Brasil chegou a 1.736 mortes provocadas pela doença e ao menos 28.320 casos confirmados.
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No centro das divergências entre os dois estavam medidas de isolamento social implementadas por governadores e prefeitos – endossadas por Mandetta – e o uso do medicamento hidroxicloroquina no tratamento da doença – defendido enfaticamente por Bolsonaro.
Durante a crise, o presidente chegou a se referir à doença como “gripezinha” ou “resfriadinho” e adotou postura crítica a políticas mais duras de enfrentamento à pandemia, contrariando recomendações de autoridades sanitárias nacionais e internacionais.
Bolsonaro é defensor da reabertura das atividades, sob alegação de severos impactos econômicos causados pela quarentena. O presidente sugere o chamado “isolamento vertical”, que consiste em restrições apenas para grupos considerados de risco, como idosos e portadores de doenças crônicas.
As posições do mandatário contrastam com o que defende a maior parte da população, como indicam pesquisas recentes, por isso custaram apoio da sociedade ao governo e motivaram uma onda de panelaços em diversas cidades do país.
A perda de popularidade do presidente e a contrastante conquista de forte apoio popular pelo ministro – e por governadores, que se tornaram os principais adversários políticos de Bolsonaro na crise – foi mais um ponto a colocar os dois em rota de colisão.
No início do mês, Bolsonaro já havia exposto sua insatisfação com o então ministro. Em entrevista à rádio Jovem Pan, disse que “faltava humildade” a Mandetta.
Dias depois, em conversa com apoiadores em frente ao Palácio do Alvorada, afirmou que “algumas pessoas” do seu governo “de repente viraram estrelas e falam pelos cotovelos” e que não teria medo de usar a caneta contra eles. Foi o que quase aconteceu nove dias atrás, mas o movimento acabou debelado pela ala militar do governo.
O clima de trégua durou até o último fim de semana. No sábado (11), Mandetta participou de uma visita com Bolsonaro ao primeiro hospital de campanha do governo federal, em construção no município de Águas Lindas (GO). A visita também contou com a participação do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), que havia anunciado rompimento com o presidente. Depois do encontro, Bolsonaro deixou o local e andou para conversar e cumprimentar apoiadores que se aglomeraram para vê-lo.
Na ocasião, o ministro limitou-se a dizer que não julga ninguém e que a recomendação pelo distanciamento social “vale para todos os brasileiros”. No dia seguinte, porém, em entrevista ao programa Fantástico, da TV Globo, pediu um discurso unificado do governo e disse que o brasileiro não sabe se escuta ele ou o presidente.
O tom incomodou ministros da ala militar do governo, que viram no gesto um novo confronto com o mandatário e um desprezo aos esforços por acalmar os ânimos. O desembarque deste grupo foi decisivo para a confirmação da demissão de Mandetta.
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