Como Aécio Neves ajuda Michel Temer a chutar o PSDB do governo?

Na prática, trata-se de um "jogo de comadres", com estratégias bem delimitadas dos dois lados

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Após sinalizar indisposição em atender às demandas do “centrão” e realizar uma reforma ministerial que melhor respondesse à nova correlação de forças na base governista, o presidente Michel Temer mudou de postura e agora diz reservadamente que promoverá mudanças na equipe em até quinze dias. A ação é tida no mundo político como vital caso o peemedebista queira dar continuidade à agenda de reformas econômicas — mais pontualmente, ter chances de aprovar a Reforma da Previdência mesmo com calendário adverso, em meio à aproximação das eleições.

Até o fim da semana passada, o presidente resistia à pressão de aliados por punir tucanos por terem votado majoritariamente pela admissibilidade da denúncia apresentada pela PGR (Procuradoria Geral da República) que o afastaria do cargo. Existia um receio por parte do peemedebista em assumir o primeiro movimento que provavelmente desencadearia no desembarque oficial do PSDB da base governista. A preferência era por aguardar pela iniciativa dos próprios tucanos, cuja saída já era amplamente esperada para qualquer momento antes da intensificação da corrida eleitoral. Foi o que aconteceu. E graças a um fiel aliado de Michel Temer no atual carnaval político.

Na última quinta-feira, o senador Aécio Neves (MG), presidente afastado do PSDB, destituiu o senador Tasso Jereissati (CE) do comando interino do partido em uma manobra muito contestada internamente. Por trás da alegação de “isonomia” para a disputa por sua sucessão na convenção nacional em dezembro, há uma intensa disputa entre alas rivais na legenda. O clima esquentou dentro do partido e um cenário de autofagia tucana ganhou força nas avaliações dos analistas da conjuntura política. Observando a situação gerada, em convenção do partido realizada em Belo Horizonte, Aécio admitiu que já existe um consenso na legenda de que está chegando o momento de deixar a base de apoio do governo. A iniciativa foi vista como uma tentativa de dar um passo em direção a alguma pacificação no ninho tucano.

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“Há um convencimento de todos nós de que está chegando o momento da saída (do governo Temer). Mas quero sugerir aos dois candidatos (à presidência do PSDB), o governador Marconi Perillo e o senador Tasso Jereissati, que convoquem os ministros do PSDB para definir o momento da saída. Vamos sair pela porta da frente, da mesma forma como entramos”, afirmou Aécio. O senador, contudo, manteve compromisso com a agenda de reformas proposta pelo governo.

As falas do tucano foram suficientes para justificar uma nova postura do presidente Michel Temer. Se o peemedebista não avançava com uma reforma ministerial muito por conta da indisposição em comprar uma briga com o PSDB, o ambiente mudou com as sinalizações da principal representação da ala governista no partido. Agora Temer pode dar ouvidos ao “centrão” e oferecer maiores fatias do governo àqueles que foram fieis ao seu governo nos momentos mais difíceis. Encabeçando a lista de Natal dos fisiológicos está o famoso Ministério das Cidades, posto central em uma disputa eleitoral, com boa capacidade de investimentos e elevada interlocução com prefeitos.

Nada diferente do chamado “jogo de comadres”. Do lado do PSDB, busca-se ganhar com um distanciamento do governo neste momento, embora um futuro candidato do partido à presidência tenha que ter conhecimento da importância de contar com eventual apoio do PMDB, de Michel Temer. Do lado do atual governo, há um avanço em direção à construção da base de apoio necessária para tocar a agenda de reformas, na medida do possível. O presidente se esforça para reverter o elevado nível de reprovação, em movimento atrelado ao próprio desempenho da economia, para, assim, ter maior capacidade de influenciar as próximas eleições. Resta saber se será exitoso ou se aproximará do que ocorreu com José Sarney.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.