Conselho Federativo deve aprimorar regras de controle externo e definir critérios de governança, defendem debatedores

Participantes também defendem atuação do colegiado como indispensável para viabilizar reforma tributária

Luís Filipe Pereira

Plenário do Senado Federal em Brasília (Lula Marques/Agência Brasil)
Plenário do Senado Federal em Brasília (Lula Marques/Agência Brasil)

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Um dos pontos de divergência entre governadores e parlamentares no âmbito da reforma tributária (PEC 45/2019), a instituição de um Conselho Federativo para a gestão dos recursos arrecadados pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) foi defendida por especialistas durante em debate na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, na tarde desta quarta-feira (13), ainda que, na avaliação deles, sejam necessários ajustes na proposta.

Atualmente, o dissenso entre gestores estaduais está nos critérios envolvendo mecanismos de deliberação e governança. Segundo o texto da PEC aprovado em dois turnos pela Câmara dos Deputados, o órgão conterá três instâncias de veto, além de independência técnica e administrativa, e representação paritária em sua instância máxima para todos os Estados, o Distrito Federal e todos os municípios. E ainda que o governo reafirme que o órgão terá apenas função administrativa, os governadores não querem perder poder de influência no colegiado.

A proposta prevê que serão consideradas aprovadas as matérias que obtiverem, cumulativamente, os votos da maioria absoluta dos representantes de cada unidade da federação e de representantes que correspondam a mais de 60% da população do País. Por fim, também será necessário o aval da maioria absoluta dos representantes do segundo grupo, formado pelo DF e o conjunto de municípios.

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Para além do debate de representatividade, o auditor de controle externo do Tribunal de Contas da União, Eduardo Fávero, crê que ainda é preciso definir o órgão responsável por analisar denúncias sobre eventuais abusos ou infrações cometidas pelo colegiado.

“O artigo 156b, parágrafo 2º e inciso 4º, prevê que o controle externo do Conselho Federativo vai ser exercido pelos poderes legislativos dos entes federativos, ou seja, todas as Assembleias Legislativas, mas todas as Câmaras de Vereadores, com auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados, do DF, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios, que atuarão de forma coordenada. E ponto, o projeto silencia nessa etapa. Nós identificamos um alto risco de uma indefinição nessa operacionalização desse controle externo. Porque o desenho, por enquanto, ainda está muito aberto”, questionou. o auditor de controle externo do Tribunal de Contas da União, Eduardo Fávero.

“Tudo aquilo que a PEC determina que deve ser resolvido por lei complementar não competirá ao Conselho Federativo. Toda disciplina relacionada ao IBS está relacionada a lei complementar e tudo que é remetido a lei complementar são competências do parlamento. O Conselho vai tão somente aplicar a legislação”, defendeu Manoel Nazareno Procópio de Moura Júnior, auditor fiscal do Estado de Minas Gerais e diretor de Programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária.

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Segundo Moura Júnior, boa parte das funções administrativas vai permanecer nas secretarias estaduais de Fazenda, como a fiscalização e a cobrança. No entanto, há questões operacionais que, por se tratar de um tributo de competência conjunta, devem ser solucionadas conjuntamente pelos entes subnacionais (Estados e municípios).

“Não tem União, não tem terceiros. A mesa em torno da qual se senta o Estado e o município, na PEC 45, na versão da câmara, convencionou-se chamar Conselho Federativo. Dada a sua natureza operacional, podemos chamar de Agência Tributária Nacional, Comitê Gestor, realmente, talvez sejam até terminologias mais adequadas”, complementou.

Segundo a consultora internacional e especialista em Imposto sobre Valor Agregado (IVA), Melina Rocha, que também participou do debate, a criação de uma “câmara de compensação” sem concentrar a arrecadação do IBS em um Conselho Federativo deixaria os entes federativos dependentes um dos outros, e não atacaria um dos problemas que a reforma se propõe a resolver, de tornar mais simples a relação entre contribuintes e fisco.

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“Um Estado teria que repassar recursos  para o outro, e para os municípios. Haveria maior número de conflitos entre as unidades, e os Estados seriam dependentes dos repasses de São Paulo, de onde sai a maioria dos bens e serviços consumidos no país. Vejo que a distribuição dos recursos pelo Conselho Federativo vai seguir regras e fórmulas previstas na lei complementar, sem qualquer tipo de discricionariedade”, defendeu.

A inclusão de representatividade de 60% da população no texto aprovado pela Câmara beneficia Estados mais populosos, como São Paulo e Minas Gerais, que passariam a ter mais poder de influência na tomada de decisão do órgão, caso a redação seja mantida pelos senadores. Durante sua apresentação Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt, consultora sênior do Banco Mundial e ex-secretária Estadual de Fazenda de Goiás defendeu que as decisões no âmbito do Conselho levem em consideração maioria formada por dois terços dos representantes somada ao voto favorável de um terço dos representantes em cada região região.

“O Conselho não vai receber ordem de ente A, B ou C. Vai passar por um processo de votação. O primeiro modelo que foi falado levou em consideração a isonomia. E aí, nós temos uma experiência que não foi bem-sucedida dentro do Confaz [Conselho Nacional de Política Fazendária] e do Comsefaz [Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal], com Nordeste e Norte se juntando fazendo maioria e se sobrepondo às outras regiões. Dentro do Comsefaz sempre houve presidentes do Nordeste”, observou.

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Diferentemente dos senadores Esperidião Amin (PP-SC) e Marcos Rogério (PL-RO), que se manifestaram durante a audiência de maneira contrária à criação do Conselho, os especialistas foram unânimes ao defender a criação do Conselho como ferramenta indispensável para a implementação da reforma, que prevê a simplificação do sistema tributário a partir da unificação dos tributos federais PIS e Cofins na Contribuição sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), e com o IBS correspondendo aos impostos estaduais e municipais (ICMS e ISS).

De acordo com Luiz Dias, representante do Encontro de Coordenadores e Administradores Tributários (ENCAT), o órgão tem trabalhado junto ao secretário extraordinário Bernard Appy e a Receita para desenvolver um sistema com foco na integração dos documentos fiscais eletrônicos ao longo da transição. Ele destacou o papel do Conselho como colegiado administrativo responsável por fiscalizar o cumprimento da legislação e aplicar as normas que serão estabelecidas por meio de leis complementares, como as regras que estarão vigentes para os regimes diferenciados de tributação, por exemplo.