Governo faz ofensiva junto ao STF contra restrições a políticos em estatais; caso impacta Petrobras (PETR4)

Uma eventual derrubada da decisão em vigor poderia ter repercussão no caso de Jean Paul Prates, alvo de ações que questionam sua presença no posto de CEO

Reuters

Fachada do palácio do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília (DF), em 11/04/2023 (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil)
Fachada do palácio do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília (DF), em 11/04/2023 (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil)

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BRASÍLIA (Reuters) – A Advocacia-Geral da União (AGU) deflagrou uma ofensiva no Supremo Tribunal Federal (STF) para evitar a retomada de algumas restrições para que políticos ocupem cargos de direção de estatais, em um delicado julgamento para o governo previsto para ser retomado na quarta-feira, disseram fontes do tribunal e do governo ouvidas pela Reuters.

O caso é sensível porque o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem usado esses cargos para atender a indicações de partidos que dão sustentação política no Congresso, notadamente o centrão. Mas um pedido de vistas é esperado, o que adiaria uma decisão sobre o assunto para o primeiro semestre de 2024, segundo duas fontes ouvidas pela Reuters.

No caso de uma decisão contrária ao governo, o processo poderia ter repercussão na Petrobras, que recentemente aprovou uma mudança no estatuto para permitir que políticos possam ocupar posições na alta cúpula da empresa. O atual presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, foi senador antes de assumir o comando da empresa.

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O que está em jogo é uma decisão dada pelo então ministro do STF Ricardo Lewandowski em março, antes de se aposentar, que suspendeu os efeitos do trecho da Lei das Estatais que restringe indicações de conselheiros e diretores a empresas públicas e sociedades de economia mista que sejam titulares de alguns cargos públicos ou que tenham atuado, nos três anos anteriores, na estrutura decisória de partido político ou na organização e na realização de campanha eleitoral.

A Lei das Estatais foi aprovada pelo Congresso em 2016 na esteira dos escândalos de corrupção envolvendo a Petrobras e outras empresas públicas investigadas pela Operação Lava Jato.

Tais restrições estão temporariamente suspensas por decisão de Lewandowski, e uma manifestação final do STF sobre o caso está paralisada por pedido de vista dos ministros Dias Toffoli e André Mendonça.

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Há semanas, o advogado-geral da União, Jorge Messias, tem conversado com ministros da Corte e distribuído um memorial — visto pela Reuters — em que alega que a norma estabelece discriminações por prazo desproporcional.

“Em que pesem as louváveis intenções do legislador, repita-se, cujo escopo foi o de evitar o suposto aparelhamento político das empresas estatais, bem assim o de imunizá-las contra influências espúrias, na verdade, acabaram por estabelecer discriminações desarrazoadas e desproporcionais — por isso mesmo inconstitucionais — contra aqueles que atuam, legitimamente, na esfera governamental ou partidária”, disse a AGU no memorial, transcrevendo voto de Lewandowski.

Duas fontes do Supremo ouvidas pela Reuters disseram que deve ocorrer um novo pedido de vista no julgamento, jogando a decisão para o primeiro semestre de 2024, uma vez que o STF entrará em recesso este mês. Os ministros da corte têm um prazo de 90 dias para devolver o processo.

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Essa é a expectativa também de outras duas fontes do governo que acompanham o caso e estão preocupados com os eventuais impactos em caso de derrubada da decisão de Lewandowski.

IMPLICAÇÕES NA PETROBRAS

Uma das fontes do governo afirmou que a Lei das Estatais, apesar de ter aspectos louváveis, quer criminalizar a política e criou impedimentos para acesso a esses cargos que existem para políticos, mas não para quem vem da iniciativa privada.

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“Não somos contra a lei, mas ela tem aspectos absurdos”, disse essa fonte.

Outra fonte destacou que a Petrobras alterou recentemente o estatuto da companhia para se adequar à lei após a decisão de Lewandowski.

Uma eventual derrubada da decisão em vigor poderia ter repercussão no caso do presidente da Petrobras, o ex-senador pelo PT Jean Paul Prates, alvo de ações que questionam sua presença no posto com base em dispositivos da Lei das Estatais sob julgamento, disse essa fonte.

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Além de Prates, que é CEO e conselheiro, assembleia de acionistas da Petrobras em abril elegeu como integrantes do conselho da empresa três membros do Ministério de Minas e Energia (MME), incluindo o presidente do colegiado, Pietro Mendes.

Secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do MME, Mendes foi eleito apesar de um potencial conflito de interesse apontado quando seu nome foi avaliado em órgãos da Petrobras devido ao seu cargo no governo.

Efrain Cruz, secretário-executivo do MME, e Sergio Rezende, membro titular do Diretório Nacional do Partido Socialista Brasileiro (PSB) — outros dois indicados pela União que foram eleitos — também tinham sido considerados inapropriados para compor o colegiado da empresa tanto pelo conselho anterior quanto por um comitê interno da empresa.

Prates foi indicado e tomou posse como CEO da Petrobras em janeiro, quando o posto ficou vago após a transição de governo.

Na época, após ser indicado por Lula, ele disse que estava “totalmente tranquilo em relação à Lei das Estatais”.

Segundo Prates, a sua candidatura à prefeitura de Natal, em 2020, não significaria uma barreira para ele assumir a direção da Petrobras porque não há na Lei das Estatais qualquer artigo que impeça candidatos de ocuparem cargos de direção em empresas do Estado.

Ele afirmou também, na época, que fato de ter participado do programa de governo de Lula não implicaria em nenhuma relação financeira ou participação em estrutura decisória da campanha política.

Para José Augusto de Castro, advogado especialista em direito administrativo e sócio de TozziniFreire Advogados, o tema é “bastante polêmico por diferentes razões”, no momento em que integrantes do Congresso questionam as decisões monocráticas do STF.

“Esta decisão irritou bastante diversos segmentos do Congresso, e foi um dos gatilhos da PEC que pretende limitar o poder de ministros do STF derrubarem leis sem uma decisão colegiada”, disse ele, acrescentando que se tratou de uma “decisão casuística que pode prejudicar uma boa política pública de longo prazo”.