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A medida provisória que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretende encaminhar ao Congresso Nacional para compensar os impactos fiscais da nova política de reajuste do salário mínimo e da atualização da faixa de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) deverá trazer a possibilidade de investidores com recursos em fundos exclusivos recolherem antecipadamente o tributo devido sobre o estoque.
A ideia é que o texto, com edição prevista para os próximos dias, traga a opção de pagamento do IR de forma antecipada sob condição especial, via alíquota reduzida (possivelmente em torno de 10%) e com possibilidade de parcelamento. Aqueles que optarem por não aderir às condições estariam expostos a uma alíquota mais elevada (estimada em 15%) no futuro.
O mecanismo é semelhante ao que foi introduzido para as “offshores” na medida provisória que mudava as regras para aplicações financeiras mantidas por brasileiros no exterior (MPV 1171/2023) e que irá perder validade a partir de segunda-feira (28) sem sequer ter tido comissão mista instalada. O governo pretende reenviar estas mudanças ao Congresso Nacional na forma de um projeto de lei com regime de urgência até 31 de agosto.
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Naquele texto, o governo abria a possibilidade de o contribuinte interessado atualizar o valor de bens e direitos mantidos no exterior a uma alíquota de 10%, mesmo se não fosse resgatá-lo no momento. Tal condição poderia representar uma vantagem tributária em relação a quem optasse por permanecer sob a regra antiga, em que o imposto recolhido poderia chegar a 27,5% aplicável na efetiva distribuição da “offshore” para a pessoa física.
Na prática, a medida representava uma janela de oportunidade de adequação aos contribuintes em um momento de mudança de regra ‒ e um caminho para o governo garantir recursos no curto prazo para fazer frente à perda de arrecadação com o aumento de rendimentos isentos de IRPF.
A MPV 1171/2023 buscava introduzir tributação periódica dos lucros, conforme a lógica do chamado “regime de competência”, para as “offshores” ‒ o que já existe para investimentos feitos por empresas brasileiras no exterior. Evitando assim o chamado “diferimento” por tempo indeterminado.
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Integrantes da equipe econômica do governo consideram os casos das “offshores” e dos fundos exclusivos (chamados por eles de “onshore”) problemas de mesma natureza: distorções injustificadas no sistema tributário brasileiro que permitem o não recolhimento do tributo ao longo de décadas e que oferecem vantagem competitiva em relação a produtos financeiros similares.
Fundos exclusivos são uma modalidade de investimento usada por investidores profissionais, com mais de R$ 10 milhões de patrimônio para investir. Trata-se de um instrumento personalizado, no qual o investidor pode participar de forma ativa na construção do portfólio.
Do ponto de vista tributário, a vantagem é que hoje não incide sobre ele o chamado “come-cotas” semestral, aplicável sobre outras modalidades de fundos de investimentos. O investidor vê seu patrimônio crescer sem qualquer desconto pago junto ao Fisco até o momento em que decidir liquidar o fundo e resgatar os recursos.
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A ideia do governo com a nova medida provisória, no entanto, é que esse diferencial deixe de existir e que a tributação antecipada periódica também ocorra nos fundos fechados. Especialistas em direito tributário, no entanto, veem risco de judicialização caso a ofensiva sobre os estoques se confirme, já que eles alegam que seria uma espécie de efeito retroativo da lei.
A mudança na legislação dos fundos fechados é tida como fundamental pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), para o cumprimento do objetivo de zerar o déficit primário em 2024. A expectativa é que o pagamento antecipado sobre os estoques garanta uma arrecadação adicional de R$ 3 bilhões ainda neste ano. Os demais impactos são estimados em R$ 7 bilhões a partir do ano seguinte.
Para atender as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal, que determina que atos que aumentem despesas ou resultem em renúncia de receitas deverão ter fonte compensatória indicada, o texto precisará ser encaminhado via medida provisória. Assim, a primeira parte da norma já teria efeito imediato, possibilitando ao governo incrementar a arrecadação para compensar as perdas com IRPF.
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É por isso que o texto precisará ser editado e remetido ao Congresso Nacional simultaneamente à sanção da lei complementar que trata da MPV do novo salário mínimo e da atualização da faixa de isenção do Imposto de Renda.
E a tributação de “offshores”, como já foi enviada na forma de medida provisória antes, precisará caminhar agora como projeto de lei. Desta forma, os efeitos somente poderiam ser produzidos após a aprovação por parte das duas casas legislativas.
Como complemento ao pacote de medidas voltadas à arrecadação, o governo também deverá encaminhar, até o fim do mês ‒ prazo limite para o envio do Projeto de Lei Orçamentário Anual (PLOA) de 2024 ‒, um projeto para tratar do fim da dedutibilidade dos juros sobre o capital próprio (JCP). Tal medida é observada com maior ceticismo entre agentes econômicos, em razão do impacto mais amplo.
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O líder do governo no Congresso Nacional, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), explicou o timing das ações durante sessão plenária desta quinta-feira (24), em que a casa legislativa concluiu a votação da MPV 1172/2023.
“Junto desta MP e da correção da tabela do imposto de renda (MPV 1171/2023), se encaminhou também a tributação de 2,4 mil famílias que nunca foram tributadas na história brasileira nos chamados offshores. É por isso que o governo quer, no dia de amanhã, junto com a sanção dessa medida provisória, encaminhar uma MP da tributação das onshores, dos fundos exclusivos e encaminhar um projeto de lei de tributação dos offshores“, disse.
“Claro, é necessário ter responsabilidade fiscal, mas a gente tem que saber onde escolher para quem vai estar no imposto de renda. Eu acho que não são os mais pobres, não é a classe média brasileira, não é o setor produtivo, não são 99% das sociedade brasileira que tem essa altura que está no imposto”, argumentou.