Publicidade
A menos de três meses das eleições, as campanhas do presidente Jair Bolsonaro (PL) e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) correm contra o tempo para fechar alianças e garantir palanques sólidos nos estados antes do período destinado às convenções partidárias, que começa nesta semana.
Líderes nas pesquisas, Lula e Bolsonaro reúnem entre 75% e 80% das intenções de voto totais nos cenários estimulados dos principais levantamentos divulgados nas últimas quatro semanas. Em termos de votos válidos, a soma do apoio aos dois chega a 88%.
A concentração aumenta no cenário espontâneo, que mostra a cristalização da preferência do eleitor. Neste caso, os dois candidatos reúnem a preferência de mais de 90% do eleitorado, reforçando um quadro já consolidado de polarização da disputa presidencial, na percepção de quem vota, e de espaço reduzido para o crescimento de adversários.
Continua depois da publicidade
Assim como nas pesquisas, Lula e Bolsonaro concentram os principais apoios de chefes do Poder Executivo e pré-candidatos em disputas majoritárias nos Estados e no Distrito Federal. Considerando a atual fotografia nas unidades da federação, Bolsonaro leva vantagem nas alianças no Centro-Oeste e no Sul – regiões em que o atual presidente registra seu melhor desempenho. Já Lula conta com mais apoios na região Nordeste, onde sua vantagem é maior, de acordo com os institutos de pesquisa.
Independentemente se disputarão ou não a reeleição, os governadores podem garantir estrutura para as campanhas dos presidenciáveis nos estados. No caso daqueles que não disputarão o pleito deste ano, é possível que haja maior fidelidade em comparação com candidatos locais, que podem “pular do barco” se perceberem que o apoio a um postulante ao Palácio do Planalto pode ser uma “âncora” às suas ambições políticas ou que levantar a bandeira de outro nome pode ser mais vantajoso.
“Os dois principais candidatos [à presidência] estão garantidos em grande parte dos estados [em termos de apoio por lideranças locais]. Bolsonaro parece levar certa vantagem numérica em relação a Lula, com candidatos fortes nas disputas estaduais”, observa o cientista político Cláudio Couto, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (EAESP/FGV-SP).
Continua depois da publicidade
Mas em alguns casos o apoio no papel pode não significar engajamento nas ruas por votos ao presidenciável, o que torna difícil a mensuração do real impacto de cada aliança regional sobre o processo eleitoral de uma forma geral.
Apesar de ter o Progressistas em sua base de apoio, Bolsonaro não deve contar com representantes da sigla no Nordeste trabalhando enfaticamente a seu favor. Isso também pode valer para Lula com relação a seus aliados no Centro-Oeste.
“Há certa circularidade. Se o palanque estadual é importante para alavancar a candidatura nacional mas não se viabiliza, tendo em vista certa característica do eleitorado estadual em relação à disputa nacional, o engajamento do palanque do estado à candidatura nacional não acontece. O que percebemos é certa sobredeterminação: a performance prévia da candidatura presidencial naquele estado é que vai determinar se ele vai ter ou não palanque”, observa Couto.
Continua depois da publicidade
O especialista acredita que a cristalização precoce das preferências do eleitor pode reduzir a importância dos palanques nestas eleições – o que ocorreu na última corrida presidencial, mas por motivos distintos. “Se a eleição já está muito consolidada a partir da disputa nacional, os palanques estaduais, que poderiam retomar importância depois da eleição crítica, voltam a não ter importância, porque a fatura já está, em boa medida, resolvida”, avalia.
Mesmo diante deste risco, Bolsonaro e Lula apostam alto para converter aliados nos estados e garantir posições estratégicas para atingir o eleitor local. Em muitos casos, contudo, os presidenciáveis enfrentam dificuldades para aparar arestas e evitar conflitos entre apoiadores nos próprios palanques. Na maioria das vezes, ter palanque unificado é o sonho de um candidato, mas nem sempre é possível.
“Às vezes, ter palanque duplo ou triplo pode até ser vantajoso, porque se reduz a quantidade de candidaturas locais que podem ser opostas àquela candidatura presidencial. Consequentemente, o presidenciável tem mais candidaturas trabalhando a seu favor”, pondera Cláudio Couto, que também é criador do canal Fora da Política Não há Salvação no YouTube.
Continua depois da publicidade
“Com mais de um partido, a possibilidade de capilaridade [da candidatura presidencial nos municípios] aumenta. Mas poderíamos pensar em megacandidaturas estaduais, que compensam isso tudo por uma grande aliança unificada. Agora, nem sempre essa realidade é possível. E aí, consequentemente, ter mais de um palanque pode ser favorável. O problema é menos a divisão dos palanques do que não ter candidaturas realmente fortes nos estados e alinhadas à candidatura presidencial”, reforça.
“Ter palanque unificado, mas seu candidato ao governo estadual e eventualmente ao Senado Federal muito frágeis não vai auxiliar em nada na disputa nacional – ainda que possa tecnicamente ser compensado de algumas candidaturas levarem consigo apoio de prefeitos, deputados estaduais e alianças locais. O que realmente vai alavancar a candidatura nacional em nível estadual é a força das candidaturas dos postulantes ao governo estadual. Neste caso, é melhor ter duas candidaturas fortes ao governo estadual do que uma unificada fraca”, explica.
Na política brasileira, também é bastante comum que os diretórios estaduais dos partidos não reproduzam em nível local as alianças que foram firmadas pelas executivas nacionais – o que torna o monitoramento da corrida presidencial nos estados tarefa complexa.
Continua depois da publicidade
Vale destacar, ainda, que o apoio formalizado na pré-campanha pode não significar uma aliança efetiva depois que o jogo começa. A história política brasileira é farta de exemplos de candidatos que foram abandonados até mesmo por correligionários e integrantes da coligação ao longo do processo eleitoral – fenômeno conhecido no meio como “cristianização”.
Pelo calendário da Justiça Eleitoral, as legendas têm entre 20 de julho e 5 de agosto para a realização de convenções para deliberar sobre coligações e escolher candidaturas à presidência e aos governos, bem como aos cargos de deputado federal, estadual e distrital. Depois, as siglas têm até 15 de agosto para solicitar os registros de candidatura. É por isso que muita coisa ainda pode mudar até o pontapé inicial das campanhas – ou mesmo ao longo do processo eleitoral.
A eleição está marcada para 2 de outubro. Nos casos em que houver necessidade, o segundo turno será realizado quatro semanas depois, em 30 de outubro. Embora faltem apenas 76 dias para o pleito, muitas alianças ainda estão em processo de negociação e podem ser seladas ou desfeitas em semanas.
“Na eleição de outubro, diferentemente do pleito atípico de 2018, instrumentos tradicionais de campanha, como tempo de televisão, estrutura partidária e, consequentemente, os palanques, passam a ter grande peso. A tendência é que tenhamos uma campanha mais próxima ao modelo tradicional, que vigorou de 1989 a 2014”, avalia Carlos Eduardo Borenstein, analista político da consultoria Arko Advice.
“Quando Bolsonaro ganhou, discorreu-se muito sobre o fato de ele não ter contado com estrutura [partidária] e tempo de televisão, e apenas com a campanha digital nas redes [sociais] e em aplicativos. Mas pelo que observamos posteriormente, aquele fenômeno foi muito circunscrito a 2018. Esses instrumentos e principalmente a questão dos palanques voltam a ter peso importante”, aposta.
Para o especialista, o ambiente polarizado e o fato de muitos ex-ministros do governo Jair Bolsonaro serem pré-candidatos a governos estaduais ou a vagas no Senado Federal favorecem a nacionalização das disputas locais.
Além disso, a forma como as alianças partidárias foram seladas em alguns dos principais colégios eleitorais (como São Paulo e Rio de Janeiro) pode contribuir para essa influência da disputa presidencial sobre o debate estadual.
“Os palanques dos candidatos a governador vão ter um debate centrado na questão estadual, mas é inegável que a polarização nacional de Bolsonaro com Lula vai invadir a discussão”, pontua o cientista político.
Já Cláudio Couto entende que os palanques historicamente desempenharam papel importante em processos eleitorais no Brasil, mas podem ser coadjuvantes em 2022. Sua hipótese é que o fato de as pesquisas indicarem consolidação precoce da preferência de grande parte dos eleitores faz com que as estruturas de campanha locais tenham alcance limitado no convencimento da população.
“É uma eleição em que repetimos a bipolarização entre PT e bolsonarismo que houve na outra. O cenário é um pouco mais estável, e os palanques poderiam retomar certa importância. Em contrapartida, a eleição presidencial já está muito cristalizada: começou mais cedo e se consolidou mais cedo. Com isso, há dúvidas se os palanques estaduais vão fazer tanta diferença daqui para frente, porque chegam atrasados para a disputa nacional”, argumenta.
“A estabilização do cenário tira um pouco a atipicidade. Mas surge uma segunda atipicidade, que é a precocidade da eleição nacional. Talvez, mais uma vez, os palanques acabem se tornando menos importantes do que historicamente foram. Não tanto pela perda de importância das articulações regionais em si, mas pelo fato de que a eleição presidencial acabou tendo um calendário na prática muito diferente do que havia antigamente”, complementa.
Mesmo que observe potencial limitado dos palanques estaduais na conversão de votos na disputa pelo Palácio do Planalto, Couto acredita que as disputas regionais serão valiosas na definição da correlação de forças políticas e no próprio quadro de governabilidade para o futuro presidente junto ao Congresso Nacional.
“Os palanques estaduais, nesta eleição, podem ser valiosos em si mesmos, pelo ganho de poder que os dois campos políticos – não as candidaturas, mas os campos nos quais elas se inserem – podem ter nos estados. E a importância que esse ganho de poder vai ter para disputas políticas futuras, inclusive no plano governativo. Os palanques vão definir a composição do Congresso Nacional e os governos, que podem constituir bases de poder importantes para a relação com o próximo presidente, seja ele qual for”, pontua.
Veja a seguir os principais trunfos e obstáculos para os presidenciáveis nos estados:
Peças (quase) posicionadas em SP
Alguns dos movimentos mais significativos das campanhas de Bolsonaro e Lula ocorreram nas últimas semanas em São Paulo, maior colégio eleitoral do país, com 34.667.737 de eleitores registrados segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A saída do apresentador José Luiz Datena (PSC) da disputa por uma vaga para o Senado Federal pelo estado, anunciada em 30 de junho, abriu a oportunidade para o ex-governador Márcio França (PSB), uma semana depois, desistir de concorrer ao Palácio dos Bandeirantes e apoiar a candidatura de Fernando Haddad (PT), ex-prefeito de São Paulo, garantindo palanque unificado a Lula. Além de facilitar a participação de Geraldo Alckmin (PSB), vice na chapa de Lula, no palanque do candidato petista ao governo estadual.
Agora, as atenções se voltam para a definição do vice de Haddad. Os dois nomes mais cotados para a vaga são Juliano Medeiros, presidente nacional do PSOL, e Jonas Donizette (PSB), ex-prefeito de Campinas (SP) e presidente da Frente Nacional dos Prefeitos por seis anos. O segundo é visto como favorito, tendo em vista sua capacidade de articulação para garantir posições importantes para a campanha petista no interior. O problema é que o nome não agrada Márcio França, que quer o direito de fazer a indicação para o posto. Outra opção é a ex-ministra Marina Silva (Rede), mas que gera constrangimento pelo histórico de conflitos com o PT.
Já o ex-ministro Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos) conseguiu atrair o apoio do PSD, de Gilberto Kassab, fortalecendo sua candidatura ao governo paulista e reforçando o palanque de Bolsonaro no estado. Com o acordo, o partido indicou Felício Ramuth, ex-prefeito de São José dos Campos, como vice na chapa. O movimento representou uma derrota à candidatura petista, que sonhava com o apoio da sigla.
Mas Bolsonaro ainda tem pendências em seu palanque no maior colégio eleitoral do país, em razão da desistência inesperada de Datena, que deixou um buraco na representação do grupo político ao Senado Federal.
A saída do apresentador abriu uma disputa interna na base bolsonarista e fez ganharem força nomes como os dos deputados Marco Feliciano (PL) e Carla Zambelli (PL), além do próprio ex-ministro Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia). Outro nome citado é o de Paulo Skaf (Republicanos), ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
O primeiro tem forte apoio evangélico, mas encontra resistências desde que vieram à tona denúncias de corrupção e tráfico de influência contra pastores no Ministério da Educação. Já a segunda conta com apoio popular relevante, mas não agrada os estrategistas da campanha de Tarcísio, que buscam acenar ao eleitor de “centro”. O terceiro é visto como mais próximo do perfil desejado, mas teria menor potencial de votos.
Enquanto isso, o governador Rodrigo Garcia (PSDB), candidato à reeleição, conseguiu, em 7 de julho, a formalização do apoio do União Brasil, sigla que tem como pré-candidato na disputa nacional o deputado federal Luciano Bivar (PE).
O partido, que surgiu da fusão entre PSL e DEM, tem uma das maiores representações no Congresso Nacional e conta hoje com a maior fatia do fundo partidário, além de mais minutos de propaganda no rádio e na televisão – ativo muito valioso em eleições, sobretudo para um candidato à reeleição que ainda precisa se tornar conhecido pela população.
Bolsonaro tem pendências em MG e dificuldades no Nordeste
O presidente Jair Bolsonaro enfrenta dificuldades para fechar um palanque forte em Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do país, que conta com 16.299.933, eleitores cadastrados pela Justiça Eleitoral.
Lá Bolsonaro flertou com o governador Romeu Zema (Novo), que hoje lidera as pesquisas com ampla vantagem sobre o segundo colocado, Alexandre Kalil (PSD), ex-prefeito de Belo Horizonte, que apoia a candidatura de Lula.
Os dois se reuniram, duas semanas atrás, no Palácio do Planalto, para tratar da possível adesão de Minas Gerais ao Regime de Recuperação Fiscal – e de uma aliança entre os dois no estado, que não prosperou. Bolsonaro quer que o ex-ministro Marcelo Álvaro Antônio (PL) seja o representante da chapa de Zema na disputa pelo Senado Federal. Mas o deputado federal Marcelo Aro (PP) tenta viabilizar seu nome para a disputa e conta com a simpatia do governador.
Bolsonaro conta hoje com o apoio do senador Carlos Viana (PL-MG), pré-candidato de seu partido ao governo mineiro – que asseguraria um palanque mais frágil no estado. O parlamentar aparece hoje com algo entre 2% (Genial/Quaest, 08/07/2022) e 4% (Datafolha, 01/07/2022) de intenções de voto em cenário estimulado de primeiro turno.
Há uma preocupação de aliados de Zema com uma possível associação à imagem de Bolsonaro. Hoje, o governador lidera a disputa com entre 44% (Genial/Quaest, 08/07/2022) e 48% (Datafolha, 01/07/2022) das intenções de voto, o que indica chances de vitória em primeiro turno.
Mas o eleitorado mineiro também manifesta preferência por Lula no cenário nacional. Segundo pesquisa Quaest, divulgada na última sexta-feira (8), o petista conta com 46% de apoio no estado. Isso pode indicar risco de Zema perder votos caso apoie Bolsonaro.
Segundo levantamento Datafolha, divulgado em 4 de julho, Zema conta com o apoio de 38% dos eleitores que declaram voto em Lula, ante 31% de Kalil. Nesta pesquisa, o petista lidera a corrida presidencial entre os mineiros com 48% das intenções de voto, contra 28% de Bolsonaro.
Outro fator a dificultar uma aliança entre Zema e Bolsonaro seria o fato de o Novo, partido do governador mineiro, ter pré-candidato próprio na disputa pelo Palácio do Planalto: o cientista político Luiz Felipe d’Ávila.
Tal impasse se assemelha ao observado no Ceará, onde o deputado federal Capitão Wagner (União Brasil) calcula se eventual apoio do presidente poderia ajudá-lo na disputa. Na última eleição para a prefeitura de Fortaleza, ele acabou derrotado por Sarto Nogueira (PDT), em uma disputa acirrada, tendo seu nome associado ao bolsonarismo.
Já no Paraná, a solução do impasse parece mais fácil para Bolsonaro. O governador Ratinho Júnior (PSD), candidato à reeleição, é um nome próximo ao presidente. O PL lançou o deputado federal Filipe Barros como pré-candidato, mas o parlamentar deve ser sacrificado na busca pela construção de palanque mais forte e unificado.
O desafio fica com a solução para a vaga do Senado Federal, em que hoje o senador Álvaro Dias (Podemos) disputa espaço com o deputado federal Paulo Martins (PL). O primeiro é visto como mais competitivo em disputa com o ex-juiz Sérgio Moro (União Brasil).
No Nordeste, a preferência do eleitorado por Lula dificulta articulações de Bolsonaro. No Maranhão, Josimar de Maranhãozinho (PL) retirou sua candidatura, e o PL local decidiu apoiar o senador Weverton Rocha (PDT), que sinaliza apoio ao petista.
Mesmo assim, o atual presidente conquistou o apoio do senador Fernando Collor (PTB-AL), que deve disputar o governo de Alagoas. Ele enfrentará o governador Paulo Dantas (MDB), que apoiará Lula, em aliança costurada pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL).
Na Bahia, quarto maior colégio eleitoral do país, com 11.291.528 eleitores registrados junto à Justiça Eleitoral, Bolsonaro conta com o palanque do ex-ministro João Roma (PL). Nas pesquisas eleitorais, ACM Neto (União Brasil), ex-prefeito de Salvador, lidera com folga e grande possibilidade de vitória em primeiro turno. O candidato bolsonarista tem menos de dois dígitos.
De olho na popularidade de Lula na região e no alto cruzamento de eleitores que possui com o petista, Neto adota postura moderada em relação ao ex-presidente, evitando enfrentamentos, e distante de Bolsonaro, além de tentar manter o debate local no foco da disputa.
Lula tem arestas no RJ, na PB e fragilidades no Sul
A poucos dias das convenções partidárias, Lula trabalha para alavancar seus palanques com uma possível aliança com o MDB em dez estados, afastando a sigla de sua própria candidata, a senadora Simone Tebet (MS).
O petista reúne-se com lideranças do partido nesta segunda-feira (18), e espera formalizar a aliança em Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte.
Por outro lado, talvez uma das maiores dores de cabeça de Lula esteja na formação do palanque no Rio de Janeiro, terceiro maior colégio eleitoral do país, com 12.455.812 eleitores registrados, e domicílio de Bolsonaro. No estado, o petista banca a pré-candidatura do deputado Marcelo Freixo (PSB) ao governo, mas não consegue solucionar um impasse sobre o Senado Federal.
Em troca do apoio a Freixo, petistas tentam emplacar o nome de André Ceciliano (PT), atual presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), para a vaga na casa legislativa. Mas o deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ), que hoje lidera as pesquisas e comanda o diretório de seu partido no estado, sinaliza indisposição em desistir de sua candidatura.
O Rio de Janeiro é estado estratégico para a corrida presidencial. Apesar de reduto de Bolsonaro, Lula lidera hoje a corrida pelo Palácio do Planalto entre os cariocas, com 41% das intenções de voto em simulação de primeiro turno, contra 34% do atual presidente, de acordo com pesquisa Datafolha divulgada em 1º de julho.
Apesar de o Nordeste ser onde Lula registra seu melhor desempenho nas pesquisas, ainda há arestas a serem aparadas em alguns estados da região. A principal delas está na Paraíba, colégio eleitoral com 2.966.759 eleitores registrados. A tendência é que o ex-presidente tenha um palanque duplo no estado.
Lula tem sinalizado apoio ao senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB) ao Poder Executivo e ao ex-governador Ricardo Coutinho (PT) ao Senado Federal. Mas depois da desistência de Márcio França ao governo de São Paulo, o PSB elevou a pressão para que o petista declarasse apoio ao governador João Azevêdo (PSB) em sua candidatura à reeleição.
E como fator adicional de instabilidade, Ricardo Coutinho hoje está inelegível por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em novembro de 2020, por abuso de poder político e econômico na eleição de 2014. A defesa do ex-governador tenta reverter a situação com recurso junto à Justiça Eleitoral.
Outro problema ocorre no Ceará, berço político do pré-candidato à presidência Ciro Gomes (PDT). Lá, o PT caminha junto com o PSB para apoiar a candidatura a ser lançada pelo PDT ao governo estadual, preferencialmente sendo a governadora Izolda Cela (PDT) a escolhida. O presidenciável do partido, no entanto, tem preferência pelo nome de Roberto Cláudio, ex-prefeito de Fortaleza, e não aceita dividir palanque com Lula.
Também há entraves em Pernambuco. Pelo acordo costurado entre os partidos, Lula deve subir no palanque de Danilo Cabral (PSB). A disputa, porém, é liderada pela ex-petista Marília Arraes (Solidariedade), que tenta puxar o apoio do ex-presidente.
Na região Norte, Lula conta com uma dobradinha com o governador Helder Barbalho, que busca a reeleição no Pará. O petista também tem o apoio dos senadores amazonenses Eduardo Braga (MDB), pré-candidato ao governo do estado, e Omar Aziz (PSD), que foi presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid e tenta mais um mandato no Senado Federal.
Lula enfrenta seus maiores desafios no Sul. No Paraná, ele conta tem palanque unificado com a candidatura do ex-governador e ex-senador Roberto Requião (PT), mas o candidato à reeleição Ratinho Júnior (PSD), simpático a Bolsonaro, lidera a disputa com folga.
De acordo com pesquisa TV Record/RealTime Big Data, divulgada em 27 de junho, Ratinho Júnior tem 42% das intenções de voto em simulação de primeiro turno para o governo paranaense. Requião aparece na segunda posição, com 16%.
Já em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, os palanques de Lula estão divididos e em duras disputas. No primeiro, que é um dos principais redutos bolsonaristas do país, PT e PSB tentam chegar a um denominador comum, mas as negociações têm dificuldade para avançar. O senador Dario Berger (PSB), que vem do MDB, quer ser o candidato da esquerda no estado, posto também cobiçado pelo ex-deputado federal Décio Lima (PT).
Bolsonaro conta com um palanque duplo forte no estado, formado pelas pré-candidaturas dos senadores Jorginho Mello (PL), de seu partido, e Esperidião Amin (PP).
Levantamento do Paraná Pesquisas, divulgado em 15 de junho, mostra que o atual governador Carlos Moisés (Republicanos), candidato à reeleição, lidera a disputa com 25,4% das intenções de voto. Ele é seguido por Jorginho Mello, com 15,5%, e Esperidião Amin, com 12,1%. Empatado tecnicamente com a dupla vem Gean Loureiro (União Brasil), ex-prefeito de Florianópolis. Já os dois que disputam a bênção de Lula, Dário Berger e Décio Lima, têm 5,3% cada.
No Rio Grande do Sul, o clima é tenso entre as candidaturas de Edegar Pretto (PT) e Beto Albuquerque (PSB), que disputam a posição de representante da esquerda na corrida pelo governo estadual. A divisão de votos, no entanto, ameaça a viabilidade eleitoral do grupo – o que na prática tende a enfraquecer a estrutura de Lula no estado ou até deixá-lo sem palanque em eventual disputa de segundo turno.
Levantamento Paraná Pesquisas, divulgado em 4 de julho, mostra que o ex-governador Eduardo Leite (PSDB), candidato à reeleição, lidera a disputa, com 29,5% das intenções de voto. Ele é seguido pelo bolsonarista Onyx Lorenzoni (PL), ex-ministro e ex-deputado, com 22,1% de apoio. Os demais candidatos vêm embolados: Beto Albuquerque, com 7,6%; o bolsonarista Luís Carlos Heinze (PP), com 6,6%; Edegar Pretto, com 5,3%; Pedro Ruas (PSOL), com 2,5%, Vieira da Cunha (PDT), com 2,2%, Gabriel Souza (MDB), com 2,1%, e Roberto Argenta (PSC), com 1,2%.
Apesar de o Centro-Oeste ser região de vantagem para Bolsonaro na disputa pelos palanques, Lula conseguiu firmar aliança com o deputado Neri Geller (PP-MT), que disputará uma vaga para o Senado Federal. O parlamentar foi ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento durante o governo Dilma Rousseff (PT).
O acordo em Mato Grosso também envolveu o ex-governador Blairo Maggi, que foi ministro do governo Michel Temer (MDB), mas tem boa relação com o petista. O movimento fura a aliança nacional entre o Progressistas, do atual presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e Bolsonaro.
Ciro e Tebet patinam nos palanques
Principais nomes para representar a chamada “terceira via” na corrida presidencial, Ciro Gomes (PDT), ex-governador do Ceará, e a senadora Simone Tebet (MDB-MS) têm dificuldades em construir alianças sólidas nos estados – situação que reflete os desafios que os dois pré-candidatos enfrentam para crescer nas pesquisas de intenção de voto.
De um lado, Tebet vê seu próprio partido costurar acordos regionais com as candidaturas de Lula e Bolsonaro. Seu principal palanque efetivo é no Rio Grande do Sul, onde o ex-governador Eduardo Leite (PSDB) tenta a reeleição em uma disputa que promete ser acirrada. O estado tem 8.593.469 registrados, o que equivale a 5,5% do eleitorado do país.
“Apesar de o MDB ser um partido com capilaridade muito grande, Simone Tebet também enfrenta muita dificuldade. O MDB do Nordeste está praticamente inteiro com Lula. Nas regiões Sul e Sudeste, tende a caminhar com Bolsonaro”, observa Borenstein.
“Com o desempenho que tem hoje nas pesquisas, Simone Tebet vai enfrentar esse problema. Claro que quando for visitar um estado com candidato a governador [do MDB], até será recebida. Mas o candidato vai trabalhar para outro presidenciável na prática. Esse já o comportamento tradicional do MDB. Isso aconteceu em todas as eleições em que eles tiveram candidato [próprio à presidência]. Simone Tebet depende de uma melhora de desempenho para que os líderes regionais do MDB enxerguem densidade eleitoral que justifique um alinhamento”, explica.
Já Ciro Gomes corre riscos de ter que dividir palanque em seu próprio estado, o Ceará, com Lula. Os partidos dos dois pré-candidatos caminhavam juntos no governo de Camilo Santana (PT), que nesta eleição disputará uma vaga ao Senado Federal. A candidatura da coalizão ao governo ainda não está definida. Ciro indica preferência por Roberto Cláudio (PDT), ex-prefeito de Fortaleza. Já os petistas querem o nome da atual governadora, Izolda Cela (PDT).
“Qual é o candidato a governador que Ciro Gomes poderia dizer que vai ajudá-lo a alavancar sua candidatura no plano nacional? Nem mesmo no Ceará é possível dizer que ele tem um postulante estadual que esteja evidentemente alinhado. Lá há uma aliança entre PT e PDT, que vem de muito tempo, e vai permitir ao eventual candidato, dependendo de quem for, manter um pé em cada canoa. A canoa mais forte é a que realmente conta. Neste momento, é a de Lula, não de Ciro”, observa Couto.
Na medida em que as eleições se aproximam e as pesquisas mostram dificuldades para a chamada “terceira via”, a tendência é que lideranças regionais se alinhem com uma das forças da polarização. Quanto menor for o potencial ganho que um presidenciável puder oferecer, menor o interesse de candidatos locais em se associarem a este projeto. Consequentemente, maior o risco de “cristianização”.