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O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, suspendeu, no início da tarde desta quinta-feira (29), a sessão que julga ação que pede a inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por conta de ataques ao sistema eleitoral proferidos em reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada, transmitida por veículos oficiais de comunicação.
O placar está em 3 a 1 a favor da inelegibilidade de Bolsonaro. A audiência será retomada na sexta-feira (30), a partir das 12h, iniciando pelo voto da ministra Carmen Lúcia. Nesta quinta, o ministro Raul Araújo votou contrário à ação, e os ministros Floriano Marques e André Ramos acompanharam o voto do relator Benedito Gonçalves, corregedor-geral da Justiça Eleitoral, favoravelmente ao pedido de inelegibilidade do ex-presidente.
Raul Araújo foi o primeiro a apresentar seu voto nesta quinta e abriu divergência com o relator. Ele falou por aproximadamente duas horas e reconheceu a necessidade de incluir no processo a minuta com teor golpista encontrada durante operação da Polícia Federal na casa do ex-ministro Anderson Torres, em Brasília, mas afastou qualquer influência do documento como prova a ser considerada no julgamento.
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De acordo com o magistrado, “inexiste qualquer elemento que relacione a reunião e a minuta de decreto, que é de autoria desconhecida” e não se deve imputar a Bolsonaro qualquer responsabilidade na elaboração do documento. Além disso, o ministro Raul Araújo apresentou uma justificativa temporal ao dizer que “tais fatos não poderiam servir de base do ato tido por abusivo, pois os eventos jurídicos posteriores não são capazes de serem vinculados às eleições de 2022”.
Ao analisar o discurso de Bolsonaro aos embaixadores, o magistrado citou o “princípio da intervenção mínima”, que considera que a lei penal deve ser a primeira opção para a resolução dos conflitos, e relativizou os impactos da fala do então Chefe do Executivo para o cenário eleitoral. De acordo com a justificativa de seu voto, a retórica belicosa de Bolsonaro em relação às urnas eletrônicas não teve poder de influenciar o comportamento dos eleitores, uma vez que o Brasil registrou comparecimento recorde nas seções eleitorais no pleito presidencial de 2022, marcado pelo acirramento.
Em seguida, Floriano Marques votou pela inelegibilidade do ex-presidente. O magistrado acredita que são incontroversos os fatos ocorridos na residência oficial da presidência da república na ocasião do encontro com os representantes internacionais, e sublinhou que o evento foi realizado sem participação efetiva dos órgãos da administração pública responsáveis por atividades governamentais e diplomáticas.
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Seguindo o voto do relator, Floriano analisou o discurso do então presidente da república como parte de uma estratégia mais ampla de desacreditar o sistema eleitoral e criar uma falsa narrativa para influenciar os eleitores a partir de elementos de conspiração e vitimização. O magistrado citou jurisprudência formada em 2021, quando o TSE cassou o mandato e tornou inelegível o deputado estadual eleito pelo Paraná, em 2018, Fernando Francischini, por divulgar notícias falsas contra o sistema eletrônico de votação, para defender a condenação de Jair Bolsonaro.
Ainda segundo Marques, Bolsonaro utilizou sua posição de chefe de Estado para propagar inverdades já sabidas e reiteradas, além de desvirtuar qualquer institucionalidade do encontro ao tratar de um tema que é de responsabilidade da Justiça Eleitoral. O incumbente teria tentado fortalecer seu grupo político, fragilizar a oposição e até desestimular a participação dos eleitores no pleito que seria realizado dentro de alguns meses, emulando prática recorrente em outras nações, como Venezuela, Nicarágua, Polônia e Hungria.
O magistrado também ilustrou seu argumento com o exemplo de um professor que pode ter inclinações para o terraplanismo, mas que não deve lecionar a seus alunos tal corrente reconhecidamente estabelecida em bases contrárias à ciência.
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“Convicções íntimas são respeitáveis, desde que não firam outro direito constitucional”, frisou o ministro.
Encerrando a sessão desta quinta-feira, o ministro André Ramos alegou que “a reunião esteve inserida no contexto de um fio condutor, com marcadores de passado, presente e projeções para o futuro”. De acordo com o magistrado, o ataque ao sistema eleitoral foi marcado por “falta de fundamentação idônea”, ocorrendo de maneira orquestrada dentro de um objetivo de influenciar o cenário político.
Segundo Ramos, ao sistematizar as críticas às urnas eletrônicas a partir de falsas acusações, o então presidente lançou mão de uma “narrativa delirante, não como um ato isolado e aleatório, mas por concatenação estratégica ao longo do tempo com finalidade eleitoreira”.
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Recorrendo ao argumento utilizado pelo relator Benedito Gonçalves em seu voto, o magistrado sustentou que o evento no Alvorada está estabelecido no contexto de um fio condutor, com referências a fatos do passado, com os sistemáticos ataques ao sistema eleitoral após as eleições de 2018, e projeções para o futuro, apresentando um falso risco para a realização do pleito que seria realizado dentro de alguns meses.
Ao refutar a tese da defesa de que a reunião com embaixadores estrangeiros ocorreu a partir de um diálogo institucional, o ministro André Ramos relembrou que logo após o evento o TSE viu a necessidade de se pronunciar de maneira pública para se defender dos ataques de Bolsonaro, ferindo a harmonia entre os poderes esperada em um regime republicano.